quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Lobotomia coletiva

Gazeta Mercantil, 31/7/2008, Caderno A, Pág. 8
O Brasil que esquecia a cada 15 anos o que acontecera nos 15 anos anteriores é coisa de antigamente. Como tudo vai ficando mais rápido, menos o trânsito, o intervalo entre uma e outra lobotomia coletiva foi dramaticamente reduzido. A imprensa faz o que pode para retardar o engavetamento, ou torná-lo menos abrangente. Mas poucas lembranças conseguem hospedar-se na memória nacional por um tempo superior ao das estações do ano. O país agora esquece a cada três meses o que aconteceu nos três meses anteriores.
Brasileiro sempre foi desmemoriado, mas até um Paulo Maluf, que se gaba de chamar pelo nome completo todos os integrantes da família real saudita, tem de esforçar-se para lembrar por muito tempo os acontecimentos do sanatório geral brasileiro. É muita lembrança ruim. É um escândalo atrás do outro. É muita bandidagem na classe executiva. Não há memória que agüente.
Neste começo de inverno, por exemplo, o concubinato dos deputados e traficantes do Rio disputa espaço no noticiário com a quadrilha de doutores e excelências chefiada por Daniel Dantas, que pousou nas manchetes outro dia. Pois quando a primavera vier outros vilões terão transformado em lembranças remotas os parlamentares homicidas, os ditadores das favelas, até mesmo o primeiro escroque internacional fabricado aqui.
Além de curta, impaciente, leviana, a memória nacional é pouco espaçosa: só cabe um escândalo por vez. Foi por isso que durou meia dúzia de fotos na primeira página a passagem do ex-banqueiro Salvatore Cacciola pelo noticiário dominado por Dantas e seus comparsas. O repertório de escândalos descoberto pela Operação Satiagraha arquivou o escândalo da máfia dos fiscais, que arquivou o escândalo do casal Garotinho, que arquivou o escândalo da VarigLog, que arquivou o escândalo da Providência, que arquivou o escândalo do dossiê contra FH, que arquivou o escândalo do deputado Paulinho da Força, que arquivou o escandaloso prontuário do deputado Álvaro Lins.
Se as espantosas bandidagens do outono vão sendo esquecidas, é compreensível que pareçam ter acontecido nos tempos do Descobrimento as ocorrências do último verão. O Brasil não sabe ao certo se a Floresta Amazônica ficou maior ou menor. Não descobriu onde pasta a boiada apreendida pelo ministro Carlos Minc. Nem imagina que fim levou a tremenda operação montada pelo ministro Tarso Genro para acabar com as madeireiras clandestinas. Quer saber se já ficou pronto o terceiro aeroporto de São Paulo. E não se lembra em que desvão da memória foi enterrado um certo escândalo do mensalão.
Essas lembranças ficarão ainda mais antigas, desbotadas ou esquecidas de vez quando forem iluminados os porões em que vai tomando forma, sob o olhar bovino da nação, outra ilegalidade bilionária: a absorção da BrT pela Oi. O Brasil que esquece o escândalo que acabou de acontecer começa a esquecer previamente o escândalo que ainda nem aconteceu.
Kicker: Brasileiro sempre foi desmemoriado. Agora esquece a cada três meses o que aconteceu nos três meses anteriores
(Augusto Nunes - Diretor-Editorial - Grupo CBM. E-mail: augusto@jb.com.br)

quarta-feira, 27 de agosto de 2008

Com as próprias mãos

Legal, publicaram mais uma vez uma carta minha no Painel do Leitor da Folha.

Como eles publicaram uma versão editada, por conta do tamanho, segue aqui o texto original (e sem o "afinal" trocado por "final"). Só achei que eles pudessem ter mantido o "Armas nas escolas: como é que não pensamos nisso antes?", teria sido um fechamento melhor...

A assinatura, que parece um pouco metida, foi só para contrapor à assinatura no artigo original:

FERNANDO L. NAVARRO, 31, é advogado, especialista em direito tributário e em direito público e privado e mora nos Estados Unidos.

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---------- Original Message ----------
To: Painel do Leitor <leitor@uol.com.br>

Sobre artigo de Fernando Navarro na seção Opinião de hoje ("A cultura de um povo"), é curioso ver um advogado defendendo o direito de se fazer justiça com as próprias mãos, sem passar pelo devido processo legal (due process of law), algo presente em qualquer país com sistema jurídico minimamente estruturado, qualquer que seja a cultura de seu povo.

Por outro lado, se posso punir com pena de morte os autores de furto a residências, que outros crimes Fernando Navarro imagina que deveríamos poder resolver nós mesmos, "cidadãos honestos", sem medo de sofrer sanções? Pergunto por interesse próprio, já que no meu dia-a-dia também vejo diversos crimes em andamento, os quais a Justiça não parece dar suficientemente conta ou atenção. Preciso agir rápido, antes que o governo cerceie mais um direito dos "cidadãos honestos", o de formar milícias.

Por ter morado no Texas, para mim não é surpresa que muitos americanos defendam, como resposta aos tiroteios que ocorreram em suas universidades nos últimos anos, que aos alunos seja dado o direito de entrar armados nas salas de aula -- afinal, raciocinam, se todos os alunos estivessem armados, o atirador inicial teria sido "neutralizado" rapidamente após seu primeiro tiro. Armas nas escolas: como é que não pensamos nisso antes? Devemos ser uma cultura muito atrasada nesse aspecto, mesmo...

Também pouco incomum é notar a retórica do "criminoso" vs. "cidadão honesto", como se todos pudessem ser facilmente encaixados nessa classificação dicotômica simplista. Como nosso especialista em direito tributário há de concordar, em terras brasilis muitos dos que se encaixam no arquétipo do "cidadão honesto" são, tecnicamente, "criminosos" -- pesquisa Vox Populi/UFMG mostrou o quanto ainda somos lenientes com nossas "violações cotidianas" da lei, desde que não-violentas (leia-se: sem vítima direta, mas difusa).

FABIO STORINO, 31, é administrador, especialista em segurança pública e já morou nos Estados Unidos (Texas, especificamente)
São Paulo, SP

terça-feira, 26 de agosto de 2008

Taxa de Inspeção Veicular

Quase 14 anos depois de aprovada, a inspeção veicular obrigatória finalmente começará a partir de 2 de janeiro de 2009. O custo aproximado por veículo inspecionado é de R$ 50. Como no caso de todos os demais serviços públicos, fica a questão: quem deve pagar a conta?

Se for a Prefeitura, a fatura será efetivamente paga pela população em geral, incluindo aqueles que nem possuem veículo particular. Aqueles que têm cinco carros irão repassar parte da fatura para meus sogros, que não têm nenhum (nem têm habilitação). É justo? O que pensam os candidatos à Prefeitura de SP com maior intenção de voto?

Pela ordem:

Marta (PT)
População paga a conta.

Alckmin (PSDB)
Não descarta cobrança dos proprietários de veículo.

Kassab (DEM)
População paga a conta.

Maluf (PP)
Não descarta cobrança dos proprietários de veículo.

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Mais aqui (só para assinantes UOL ou Folha):

Inspeção de carros une candidatos, mas taxa não
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2608200827.htm

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Medida extrema nº 5: Limite ao licenciamento de carros

Esta é a última medida extrema do artigo em questão. Espero que consigamos implementar todas ou parte das medidas anteriores, e nunca precisar chegar a esta. É a mais dramática de todas: não é mais um limite ao uso do veículo, mas a sua propriedade. E o que fazer com os já existentes, retirá-los de circulação? Se os brasileiros já chiaram quando acharam, em 2005, que o governo ia confiscar as armas de fogo que não possuíam (a maioria da população, pelo menos), imagine então falar em confisco veicular...

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Limite ao licenciamento de carros

Talvez a solução mais drástica para conter a proliferação dos carros tenha sido a adotada em Cingapura. Além de criar elevadas tarifas para a aquisição de veículos, o governo instituiu o Certificado de Propriedade (COE, na sigla em inglês). Trata-se de leilão de licenças que limita o número de automóveis na cidade-Estado, uma ilha com pouco mais de 4,6 milhões de habitantes. O custo de cada licença pode chegar a algo em torno de 21 mil reais. Hoje, há cerca de 851 mil veículos na ilha. Na última década, a frota cresceu menos de 2,5% ao ano.

"O sistema é semelhante ao aplicado aos taxistas do Brasil, que possuem um número limitado de placas para rodar", explica Eric Ferreira. Xangai, a maior cidade da China, com 17 milhões de habitantes, adotou um sistema semelhante. Lá, as licenças para comprar automóveis podem custar mais de 5 mil dólares.

"Trata-se de uma medida muito dura, mas necessária. Em Xangai, um trajeto de 15 quilômetros pode levar mais de três horas e meia", comenta o engenheiro Paulo Sérgio Custódio, hoje em Pequim, na China, onde dá consultoria em projetos locais. "Espero que São Paulo não precise adotar uma medida tão rígida como essa, mas o agravamento dos congestionamentos me deixa receoso de que isso será necessário num futuro muito próximo."
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Extraído da Revista CartaCapital, Medidas extremas, 19/3/2008.

Medida extrema nº 4: Tarifa zero no transporte coletivo

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Tarifa zero no transporte coletivo

Com o aval da então prefeita Luiza Erundina (1989-1993), que decidiu encampar a proposta no início da década de 90, o secretário municipal dos Transportes, Lucio Gregori, tratou de apresentar o projeto de tarifa zero para os ônibus à bancada petista da Câmara. O balde de água fria foi proporcional à empolgação inicial. Vários vereadores do partido consideraram a iniciativa inviável. O próprio Lula foi contra, dizendo que o "trabalhador deveria ganhar o suficiente para pagar pelo transporte". Deixado de lado, o projeto de Gregori seria adotado como bandeira pelos jovens que há alguns anos criaram o Movimento Passe Livre, que inicialmente defendia o transporte gratuito apenas para os estudantes.

A partir de 2004, esse movimento ganhou visibilidade nacional por conta de campanhas contra o reajuste das tarifas, em cidades como Florianópolis e Salvador. "Hoje, percebemos que o movimento estava equivocado. É preciso que haja passe livre para toda a população. Quem deve arcar com o custo do transporte é a sociedade como um todo", afirma o estudante Lucas Monteiro, um dos membros do MPL, que já convidou Gregori para dar palestras em algumas capitais do País.

Na avaliação de Gregori, a tarifa zero é um diferencial imbatível para fazer os paulistanos abandonarem os carros e migrarem para o transporte coletivo. "A intenção da prefeitura era aumentar o IPTU nas áreas mais valorizadas da cidade para bancar o custo", explica. "Na França, por exemplo, um terço do valor da tarifa é pago pelo setor produtivo, um terço pelo usuário e outro pelo governo. Por que não pensamos em algo assim?"

Em Helsinque, na Finlândia, e nas cidades suecas de Estocolmo e Gotemburgo, também há grupos que lutam pela gratuidade do transporte. Como estratégia de pressão, o Movimento Planka, por exemplo, criou um fundo para bancar as multas dos associados que são flagrados pelas autoridades suecas circulando em ônibus sem pagar a tarifa.

Entre os especialistas brasileiros, a rejeição à proposta é grande. "Não há dúvidas de que o preço da tarifa precisa ser barateado, com uma política de subsídios e de incentivos fiscais. Mas a gratuidade iria onerar demais o Estado e estimular o uso pouco racional do transporte. É melhor cobrar pouco, mas cobrar", comenta Marcos Bicalho, diretor-superintendente da NTU. Dos 308,5 milhões de reais gastos com o sistema de ônibus em São Paulo no mês de janeiro, apenas 39 milhões de reais foram bancados pela prefeitura. O restante foi pago pelos usuários.

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Extraído da Revista CartaCapital, Medidas extremas, 19/3/2008.

Medida extrema nº 3: Pedágio no centro da cidade

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Pedágio no centro da cidade

O pedágio urbano é, talvez, a medida mais polêmica. Os defensores argumentam que o mecanismo poderá reduzir o número de veículos no centro da cidade e gerar recursos para investir em transporte coletivo. Os opositores criticam a falta de alternativas de transporte e o fato de pesar mais para os de menor renda.

Londres, Oslo, Estocolmo e Cingapura já adotaram o mecanismo. Na capital da Inglaterra, os motoristas pagam 8 libras para entrar no centro da cidade. Ônibus, táxis e motos estão isentos da cobrança. Os automóveis pagam de 1 a 2 euros para entrar no centro da capital sueca, dependendo da hora do dia.

Num debate realizado em julho de 2007, na Austrália, o secretário-geral do Fórum Internacional do Transporte, Jack Short, apresentou os avanços obtidos nessas capitais. Londres registrou queda de 30% na circulação de carros no centro. As viagens de ônibus e bicicletas aumentaram 20%. E os atrasos atribuídos aos congestionamentos caíram 30%. Em Estocolmo, o fluxo de carros reduziu 22% no período de testes. Metade dos motoristas que desistiram de circular pelo centro passou a utilizar transporte coletivo. Nos dois meses iniciais, a maioria da população achou a solução uma má idéia. Depois, a relação se inverteu.

O urbanista Cândido Malta acredita que o pedágio em São Paulo contribuirá para melhorar a infra-estrutura de transportes. "O Plano Integrado de Transporte Urbano (Pitu) indica a necessidade de se construirem mais 160 quilômetros de Metrô até 2025. O problema é o custo, cerca de 100 milhões de dólares por quilômetro", explica. "Se os veículos pagassem 1 dólar por dia para circular no centro, poderíamos utilizar o dinheiro para cumprir essa meta em 20 anos. Se a taxa fosse de 2 dólares, tese que eu defendo, o tempo seria reduzido pela metade."

Kassab rejeitou a possibilidade de a Prefeitura adotar a medida durante sua gestão. Conta com o apoio do urbanista Jorge Wilheim, ex-secretário municipal de Planejamento Urbano na gestão de Marta Suplicy (PT). "A maioria das viagens se dá dentro do centro expandido e os congestionamentos mais graves acontecem nas marginais. É mais fácil taxar todos os veículos. Mas não acho justo tomar essa medida antes de oferecer alternativa de transporte aceitável", diz Wilheim (leia o artigo). Atualmente, o Metrô paulistano tem 55 estações, 61 quilômetros de extensão e transporta 3 milhões de passageiros por dia. O plano do governo do estado é adicionar 31 quilômetros de trilhos até 2012.

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Extraído da Revista CartaCapital, Medidas extremas, 19/3/2008.

Medida extrema nº 2: Proibição do estacionamento nas ruas

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Proibição do estacionamento nas ruas

Ponto raramente mencionado no discurso dos gestores públicos, os estacionamentos em vias públicas têm um peso nada desprezível nos congestionamentos. O espaço ocupado pelos carros parados poderia permitir a circulação de outros veículos ou mesmo a delimitação de vias preferenciais para a passagem de ônibus. Essa é a razão que levou algumas capitais européias, a exemplo de Londres, a proibir o estacionamento diante das calçadas em extensas áreas, em geral no centro.

Mais do que uma medida para garantir a fluidez do tráfego, as ações visam desestimular o uso do automóvel, já que costumam vir associadas a um aumento das tarifas de estacionamento.

"Precisamos dar um destino mais nobre para as ruas, que é um bem público. Em vez de automóveis parados, é melhor reservar o espaço para os ônibus circularem com rapidez. Se o estacionamento na avenida Paulista é caro, é possível ir de Metrô", diz o engenheiro Eric Ferreira, coordenador do Instituto de Energia e Meio Ambiente, uma ONG dedicada à mobilidade urbana. Como contrapartida, Ferreira defende a construção de bolsões de estacionamento próximos a terminais de ônibus, estações de trem e de Metrô.

Ferreira não é o único a encampar a tese. Em 2007, o vereador Ricardo Teixeira (PSDB) conseguiu aprovar na Câmara Municipal de São Paulo uma lei que proibia o estacionamento nas ruas do chamado centro expandido, região delimitada pelos rios Tietê e Pinheiros, entre o bairro da Lapa e o rio Aricanduva.

Muitos comerciantes atacaram a iniciativa, temerosos de perder clientes. O prefeito vetou o projeto. Kassab argumentou que as 40 mil vagas em estacionamentos na região não seriam suficientes para absorver a demanda. Na quinta-feira 13, porém, o secretário municipal dos Transportes, Alexandre de Moraes, anunciou que a prefeitura pretende proibir os carros de estacionar em avenidas e ruas movimentadas.

O autor do projeto, que trabalhou por mais de 20 anos na Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), pretende reapresentá-lo aos vereadores paulistanos na próxima semana.

Desta vez, a lei permite o estacionamento nos horários de menor tráfego de veículos, das 10 às 17 horas. O novo projeto, contudo, traz outras proposições, como a ampliação do rodízio, de duas para quatro placas por dia, restrições à circulação de caminhões durante o dia e fixação de horários para carga e descarga.

"Este pacote deve dar um fôlego para a cidade investir em transporte de massas nos próximos anos. Só não podemos cruzar os braços e ter essa chance desperdiçada, como aconteceu com o rodízio", justifica Teixeira.

Em 1997, quando o rodízio municipal de veículos começou a vigorar, a frota da cidade era de 4,8 milhões de automóveis. Na época, cerca de 1 milhão de veículos passaram a ser impedidos de circular nos horários de pico. Mas o aumento da frota já superou o benefício inicial.

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Extraído da Revista CartaCapital, Medidas extremas, 19/3/2008.

Medida extrema nº 1: Cinco vezes mais corredores de ônibus

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Cinco vezes mais corredores de ônibus

Em muitos pontos da cidade, não vale mais a pena aumentar a frota de ônibus em circulação. Inevitavelmente, eles ficariam parados no trânsito. De acordo com o Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de São Paulo, a velocidade média dos ônibus na cidade é de 12 quilômetros por hora, metade da média de 20 anos atrás. Resultado: a lentidão e os freqüentes atrasos estimulam os usuários a migrar para outros meios de locomoção, como o carro, que circula com o dobro da velocidade.

O ritmo de expansão da malha viária não tem acompanhado o crescimento da frota. Nos últimos dez anos, a quantidade de veículos no município aumentou 25%, enquanto a infra-estrutura viária, hoje com 17 mil quilômetros de extensão, cresceu pouco menos de 6%. Para garantir maior agilidade aos ônibus, é inevitável tomar parte do espaço disponível aos carros para a criação de novos corredores exclusivos e vias preferenciais. "A população só deixará o automóvel quando o ônibus for mais rápido e oferecer conforto aos usuários", explica o consultor Paulo Sérgio Custódio.

Com experiência internacional, Custódio ajudou a implantar o projeto Transmilênio em Bogotá (Colômbia), sistema de transporte com mais de 84 quilômetros de corredores exclusivos de ônibus, considerado um projeto exemplar. Concebido entre 1998 e 2000, o Transmilênio atende cerca de 1,5 milhão de colombianos e possui corredores de alto desempenho, que permitem ultrapassagens. Com capacidade para transportar mais de 45 mil passageiros por hora, sua velocidade média é de 27 quilômetros por hora.

O projeto do Transmilênio teve como inspiração a rede de transporte coletivo de Curitiba, cuja estrutura começou a ser criada na década de 70. Segundo Henrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, a decisão de construir um sistema massivo de transporte por ônibus levou em conta, principalmente, questões orçamentárias. Os recursos necessários para a construção de um metrô de 17 quilômetros de extensão davam para construir 388 quilômetros de vias segregadas para ônibus, mais a melhoria do espaço urbano ao longo dos corredores.

"Em São Paulo, todas as expectativas repousam sobre o Metrô, mas os usuários precisam chegar até as estações de alguma forma. Um corredor de ônibus de alto desempenho pode ser tão eficiente e confiável como um trem", comenta Custódio. O consultor também lembra que um quarto do território paulistano é coberto por linhas de ônibus, enquanto os 61 quilômetros de Metrô cobrem uma área inferior a meio ponto porcentual.

Durante a gestão de Marta Suplicy (PT), a prefeitura de São Paulo lançou a meta de implantar 325 quilômetros de corredores de ônibus exclusivos até 2008. Hoje, a cidade conta com cerca de 111 quilômetros de vias segregadas para ônibus. A maioria delas não permite ultrapassagens, e a velocidade média dos veículos é de 16,5 quilômetros por hora. O governo estadual incluiu em seu plano estratégico (Pitu 2020) a meta de 560 quilômetros de corredores na região metropolitana. Recentemente, Kassab anunciou a construção de outros dois corredores, com extensão total de 28 quilômetros, ao custo de 462,5 milhões de reais.

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Extraído da Revista CartaCapital, Medidas extremas, 19/3/2008.

Medidas extremas

Excelente artigo. Qualquer uma dessas medidas seria muito bem-vinda (por mim, pelo menos). Será que alguém terá coragem de tomá-las?

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Medidas extremas

Revista CartaCapital  |  19/3/2008  |  11:46:30

Com a segunda maior frota de automóveis do mundo, 6 milhões de veículos, São Paulo avança rumo a um colapso em seu sistema viário. O maior congestionamento deste ano superou a marca de 186 quilômetros, na segunda-feira 10. Nas marginais dos rios Pinheiros e Tietê, os carros circulavam, em média, a 7 quilômetros por hora, menos de um décimo da velocidade permitida e quase o mesmo tanto de uma caminhada a pé.

Por pouco a capital não bateu o recorde histórico de 191 quilômetros de engarrafamento verificado no dia 4 de novembro de 2004, apesar de a diferença ser, na prática, imperceptível. E, mais grave, a tendência não é nada animadora. Na última década, a frota paulistana aumentou 2,5 vezes mais do que a população. São licenciados diariamente 800 automóveis na cidade, número superior à média de 500 nascimentos por dia.

A frota nacional também está em franca expansão. Nos últimos dez anos, passou de 30 milhões para 50 milhões de veículos. Em 2007, foram quase 3 milhões de automóveis produzidos e 2,46 milhões, vendidos. É o melhor desempenho da história, segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores.

Outro movimento percebido é a substituição do transporte coletivo pelo individual. De acordo com a Associação Nacional das Empresas de Transporte Urbano (conhecida pela sigla NTU), a frota de ônibus de nove capitais brasileiras caiu 9% entre 1998 e 2006. No mesmo período, o número de passageiros transportados por mês teve queda de 25%. "É o resultado das deficiências do transporte de massas e do culto ao automóvel. O Estado precisa intervir para modificar esse cenário", admite o secretário nacional dos Transportes, Luiz Carlos Bueno de Lima.

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Trânsito: o problema são os outros

http://pixdaus.com/pics/jya9HEHVMkmdh7Vizm.jpg

Trânsito insustentável

Mais uma vez, o ponto que parece finalmente ter virado consenso entre especialistas e a imprensa, mas ainda não entre os principais candidatos à Prefeitura de São Paulo:

A construção de mais linhas de metrô, promessa dos principais candidatos a prefeito, está longe de ser considerada suficiente para contornar a piora do trânsito. Primeiro pela demora das obras. Segundo, pois não haverá metrô na porta da casa de todo mundo. Terceiro porque não é suficiente para levar a maioria a deixar o carro na garagem, dizem analistas.


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São Paulo, segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Trânsito precisaria de uma Paulista nova por semana

Especialistas dizem que medidas duras de restrição ao automóvel são inevitáveis

Nem Rodoanel nem expansão do metrô seriam capazes de conter cerco ao uso de carros na capital paulista, avaliam técnicos

ALENCAR IZIDORO
RICARDO SANGIOVANNI
DA REPORTAGEM LOCAL

A vida de quem se desloca de carro na cidade de São Paulo vai se tornar cada vez mais difícil ou, no mínimo, mais cara.
Será uma conseqüência inevitável às medidas de restrição ao uso do automóvel que a prefeitura deverá adotar nos próximos quatro anos, independentemente do partido político que estiver no comando, conforme apostam especialistas.
Alguns avaliam que a impopularidade de ações prejudiciais ao transporte individual deve ser no curto prazo até inferior ao desgaste motivado pela deterioração do trânsito.
O cenário foi traçado por técnicos entrevistados pela Folha para falar de tendências diante do crescimento da frota da capital paulista, que, no saldo deste ano, já recebe mais de 1.300 veículos diariamente.
Para amortizar os impactos seria necessário construir uma avenida como a Paulista por semana na cidade —medida obviamente inviável.
A maioria dos técnicos considera que não há Rodoanel, limitação ao transporte de carga, expansão da rede do metrô ou modernização de semáforos capaz de reverter a tendência de restrição ao carro, ainda que possa postergá-la.

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quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Portabilidade numérica

Não estão falando muito disso, mesmo, ou eu é que tenho a infelicidade de ligar a TV sempre quando estão falando das Olimpíadas? Nem no jornal eu li sobre isso nos últimos meses, descobria notícia abaixo por acaso.

Acho que, junto com a idéia de poder escolher o número da operadora no momento da discagem de DDD e DDI, é um dos melhores mecanismos que existe de competição na telefonia -- entre as operadoras existentes, diga-se de passagem. Com as fusões que já aconteceram e as que ameaçam acontecer, o número de competidores vem diminuindo...

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PLANTÃO INFO / 07/2008 / tecnologia

Anatel defende portabilidade numérica

Reuters | Terça-feira, 22 de julho de 2008 - 12h23

SÃO PAULO - A Anatel garante que até 10 de março de 2009 todos os brasileiros poderão usufruir do recurso de mudar de operadora, fixa ou móvel, e levar consigo o número de sua linha.

A agência rebate, uma a uma, todas as críticas ou possíveis dificuldades que o processo possa enfrentar e até despreza pesquisas sobre o sucesso da medida. Para a autarquia, o importante é garantir que o consumidor tenha esse direito.

O trabalho de implantar a portabilidade numérica no país, a partir de 1º de setembro deste ano, está sob a coordenação de Luis Antonio Vale Moura, coordenador do Grupo de Implementação da Portabilidade (GIP) da agência.

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Vinte milhões por cento!!!

Uau... Se alguma coisa custasse $1 em Zimbábue no começo de maio, em junho já custava $22.001!

Incrível com Mugabe consegue se manter no poder, e o país ainda não entrou em convulsão social... (ou entrou faz tempo, e ele não deixa divulgar)

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São Paulo, quarta-feira, 20 de agosto de 2008

HIPERINFLAÇÃO

Alta dos preços no Zimbábue supera os 11.000.000% ao ano

DA FOLHA ONLINE

A hiperinflação do Zimbábue alcançou em junho o recorde anual de 11.200.000%, segundo dados oficiais citados pelo jornal ligado ao governo "Herald". A inflação oficial em maio foi de 2.200.000%, número que muitos analistas consideraram subestimado.
O ministro das Finanças do país, Samuel Mumbengegwi, confirmou o dado, segundo a rede americana de TV CNN, mas disse que a alta da inflação não é algo que ocorre só no Zimbábue.
"Embora nosso caso tenha se agravado pelas sanções ilegais impostas pelas potências ocidentais, a alta dos preços dos alimentos é um fenômeno mundial devido ao uso de biocombustíveis", afirmou. "Mas continuamos a lutar contra a inflação, tentando garantir que os preços cobrados sejam realistas."
Segundo analistas, os dados divulgados pelo governo sobre inflação são moderados. Na semana passada, o Kingdom Bank -um dos principais bancos do país- informou que a taxa de inflação atual no país está em mais de 20.000.000%.
A crise econômica vem acompanhada de uma paralisação política desde a controversa reeleição no fim de junho do ditador Robert Mugabe, depois de uma campanha marcada pela violência contra os opositores.
No início deste mês, as autoridades do Zimbábue decidiram proibir por um ano a exportação de determinados produtos da cesta básica, na esperança de acabar com a escassez crônica.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi2008200826.htm

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

propostas de governo

Por enquanto, ponto para a Soninha. Apesar do resumo telegráfico das propostas, é a mais sensata de todas, seguida pela do Ivan Valente, acreditem se quiser (melhor: leiam abaixo).

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São Paulo, sábado, 16 de agosto de 2008

Eleições 2008 / DNA Paulistano

Só metrô pode aliviar o trânsito na região, afirmam candidatos

Alckmin e Kassab querem manter projeto de expansão; Marta promete mudar traçado


0O metrô, responsabilidade do governo do Estado, liga os principais candidatos à Prefeitura de São Paulo quando o assunto é o trânsito na zona sul. Pela segunda semana, a Folha publica respostas para questões específicas sobre regiões da cidade, formuladas a partir de problemas identificados pela própria população na pesquisa "DNA Paulistano". É o maior levantamento já feito pelo Datafolha sobre São Paulo e seus habitantes, com 28.389 pessoas entrevistadas. Na região sul, foram ouvidas 2.447 pessoas.
Alckmin (PSDB) e Kassab (DEM) vão continuar com o atual projeto de expansão do metrô, que interligará a linha 5 à linha 2. Marta (PT) promete mudança no traçado previsto, já que a estação Cachoeirinha-Conceição, passando pela av. Faria Lima e pelo aeroporto, não está no atual projeto.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1608200806.htm

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São Paulo, sábado, 16 de agosto de 2008

Como reduzir o trânsito causado pelo crescimento imobiliário e do comércio?

Marta Suplicy (PT)
Construiremos a linha de metrô Cachoeirinha-Conceição, que passará pela av. Faria Lima e pelo aeroporto; investiremos na expansão da linha 5, levando-a do largo 13 até a Chácara Klabin, e faremos corredores de ônibus. Vamos rever a lei de ocupação da cidade.

Geraldo Alckmin (PSDB)
Vamos prolongar a av. Roberto Marinho até a Imigrantes e fazer a ligação com a av. do Estado. Faremos melhorias na av. dos Bandeirantes. Ampliaremos a linha 5, interligando-a à linha 2. Vamos arrumar calçadas e aumentar freqüência e qualidade dos ônibus.

Gilberto Kassab (DEM)
Na próxima gestão vou investir, no mínimo, mais R$ 1 bilhão no metrô. Já destinamos R$ 200 milhões para as futuras estações Campo Belo e Adolfo Pinheiro. O trânsito vai melhorar quando a linha 5 chegar à Santa Cruz, ligando a zona sul às demais linhas.

Paulo Maluf (PP)
O grande problema do trânsito da zona sul advém dos congestionamentos das marginais dos rios Pinheiros e Tietê. Daí a minha intenção de construir seis faixas de trânsito a mais, em cada lado das duas marginais, com a cobertura parcial do leito dos rios.

Soninha (PPS)
Terminar/melhorar a conexão dos corredores aos terminais de ônibus; melhorar a operação dos corredores; criar linhas de transporte interbairros (inclusive de barcas); incentivar a atividade econômica na região, reduzindo a distância entre casa e trabalho.

Ivan Valente (PSOL)
O comércio cresceu sem que houvesse um planejamento. Com o colapso do trânsito, é preciso investir em transporte público de massas sobre trilhos e ampliar os corredores de ônibus, em alguns casos, duplicando a pista. Além de investir no sistema cicloviário.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1608200806.htm

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Os candidatos main stream continuam colocando ênfase no metrô como a principal solução. Não é.

Claro, todos gostam de metrô: é rápido, limpo e seguro, e fica predominantemente debaixo da terra, ou seja, não agride a paisagem e os carros não precisam dar preferência para os trens (já com o ônibus, os carros disputam espaço viário). Só tem dois "probleminha": (1) é muito caro! (2) sua construção é demoradíssima!

Sobre o item 2, a resposta comum é: alguma hora teremos que começar. Mas se há restrição orçamentária (da última vez que chequei, há), e há opções com custo-efetividade muitíssimo maior (custo por quilômetro, passageiros por quilômetro, passageiros por hora etc.), pergunto: por que então não dar preferência orçamentária para outras opções?

Para quem visitou Bogotá, ou ao menos foi na ótima mostra fotográfica que ficou em cartaz no SESC Vila Mariana até começo deste mês, deve ter conhecido o sistema TransMilenio. Inspirado no sistema de Curitiba, acabou servindo de inspiração para outras cidades latino-americanas (que eu conheça, Santiago do Chile, onde sua implementação foi um desastre --não por demérito da idéia, mas de sua implementação, mesmo--, e Quito, no Equador).

O sistema colombiano custou pouco menos de US$ 6 milhões por quilômetro, para atender 1 milhão de passageiros por dia. Se tivessem optado pelo metrô, cada quilômetro teria custado dez vezes mais (só a capa desse relatório já é um show à parte...). Vale lembrar a ótima entrevista de Paulo Sergio Custodio na Folha. Segue trecho interessante para esta discussão:

METRÔ
A nova linha 4 do metrô de São Paulo só vai ter 400 mil passageiros "novos" por dia. Os demais 500 mil são gente que já usa o metrô. São feitas 30 milhões de viagens diárias em São Paulo. Ou seja, o metrô custa uma fortuna para levar um grupo minúsculo. Mas veja o poder das empresas e a fortuna que move o metrô, veja a Alstom, então fica difícil competir com os corredores de ônibus.

Justiça fiscal

[...] se a proposta "é fazer justiça fiscal", ela deve ser feita "por meio do gasto e não por meio da receita"
Everardo Maciel

É tão difícil assim entender esse conceito?! Comentários meus no final do artigo.

* * *
São Paulo, domingo, 17 de agosto de 2008

Para especialistas, país deveria ampliar a tributação sobre a renda e o patrimônio

DA REPORTAGEM LOCAL

Apenas aumentar o número de alíquotas do Imposto de Renda não resultará em maior progressividade na tributação das pessoas físicas, conforme sugeriu a nova secretária da Receita, Lina Maria Vieira.
Para especialistas no assunto, mais do que criar novas alíquotas para o imposto, o Brasil precisa mudar o foco da tributação, hoje excessiva sobre o consumo e reduzida sobre a renda e o patrimônio. Seguindo uma tendência quase absoluta no mundo, seria preciso fazer exatamente o contrário, entendem os especialistas.
Para Everardo Maciel, ex-secretário da Receita Federal no governo FHC, "não é preciso mexer no que está aí [as duas alíquotas]. A proposta é ultrapassada. É ridículo propor mais alíquotas e improvável que isso venha a prosperar".
"Aumentar o número de alíquotas é uma decisão retrógrada. A União Européia, por exemplo, estuda a possibilidade de criar alíquota única", afirma a advogada Elisabeth Libertuci, do escritório Libertuci Advogados Associados.
O advogado Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário), também defende a maior tributação sobre o patrimônio e a renda -no caso, renda definida como a sobra do rendimento destinada ao acréscimo patrimonial. "É típico de países pobres tributar o consumo e não a renda e o patrimônio. O Brasil precisa mudar esse foco."
Para o advogado Fernando Aurelio Zilveti, doutor em direito pela USP e professor da Escola de Administração da FGV, já é tempo de o país implementar a tributação mais efetiva sobre a renda, seguindo os moldes internacionais. "Aumentar excessivamente a progressividade ou o número de alíquotas do IR seria um atentado à eficiência fiscal."

Simplificar mais
Segundo Everardo, nenhum país criou mais alíquotas ou elevou a progressividade do IR de 1970 para cá, pois "a tendência mundial é simplificar cada vez mais". Além disso, se a proposta "é fazer justiça fiscal", ela deve ser feita "por meio do gasto e não por meio da receita".
Libertuci ressalta um aspecto negativo com a criação de alíquotas maiores -no caso de elas serem propostas pela Receita. "Haverá maior evasão, mesmo com o vasto arsenal anti-sonegação à disposição da Receita. O brasileiro é muito criativo. Alíquotas maiores são um risco desnecessário."
Ela diz que comparar as alíquotas nominais brasileiras com a de outros países, como argumento para criar alíquotas muito altas, gera distorção. "O que vale são as alíquotas efetivas, já consideradas as deduções permitidas."
Segundo a advogada, embora tenha alíquota nominal maior do que a brasileira, os EUA praticam alíquota efetiva em torno de 20%. "No Brasil, quem ganha R$ 8.000 por mês já tem alíquota efetiva de 20%; com R$ 10 mil, de 22%."
Amaral diz que um estudo do IBPT mostra que, no Brasil, a tributação é dividida em 65% sobre o consumo, 3,5% sobre o patrimônio e 31,5% sobre a renda. "O Brasil é um dos países que mais concentram a tributação sobre o consumo. Nos EUA e na Europa ocorre exatamente o oposto." (ver quadro acima).
Para o advogado, novas alíquotas poderiam ser criadas, desde que fossem observados dois detalhes: teriam de ser menores e maiores do que as atuais (o ideal seriam sete, entre 5% e 35%, com intervalos de cinco pontos) e que, ao mesmo tempo, fosse permitido abater parcela maior com educação -o limite para este ano foi de R$ 2.480,66 por pessoa-, os gastos com material e transporte escolar, com remédios de uso contínuo, as despesas com aluguel e os juros do SFH. (MC)

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/fi1708200820.htm

* * *

O conceito de redistribuição de renda depende do que você paga e do que você recebe de volta. É essa diferença que diz se você deu renda para os outros, ou recebeu renda dos outros. Por que não fazer justiça social (ou fiscal) pela receita, então? (1) Aumenta complexidade do sistema (o custo de se pagar impostos, sem contar os impostos em si); (2) Aumentam as oportunidades de sonegação; (3) Distrai do que deveria ser o principal foco da população e da mídia: os gastos públicos, onde é gasto, para quê e para quem, sua eficiência/efetividade etc.

Eu, particularmente, prefiro que a tributação seja feita pelo consumo, por um motivo bastante simples: é mais fácil e mais barato fiscalizar 1 milhão de empresas do que 100 milhões de trabalhadores. Posso estar redondamente enganado (não estudei muito a fundo o tema), mas me parece bom senso.

Aliás, dá para tributar a renda mais fortemente seguindo a mesma lógica, se acabarmos com todas as alíquotas e faixa de isenção. Exemplo: tributa-se X% do faturamento de todas as empresas, direto na conta bancária delas, como uma CPMF (na receita em vez de no desembolso). É como se tributássemos a folha de pagamento, mas sem precisar que a empresa fique calculando as várias alíquotas, imposto disso, imposto daquilo, este está isento etc. E, melhor: se a empresa contrata algumas pessoas como PJ, muito comum hoje, não será mais vantagem tributária nenhuma (o que as pressionará para registrar todos os funcionários em carteira, já que não há mais diferença do ponto de vista tributário).

Mas tem um grande problema: como fazer isso num país em que a maior parte dos trabalhadores não são registrados formalmente em carteira? Talvez por isso tenhamos optado por concentrar a maior parte da tributação no consumo. Novamente: mais fácil e mais barato fiscalizar 500 mil negócios informais do que 50 milhões de trabalhadores informais. É por praticidade, mais do que por princípio.

O princípio, aliás, é o mesmo em qualquer um dos sistemas: um dos papéis fundamentais do Estado é o distributivo. E, regem os princípios morais e políticos mais elementares, essa distribuição deveria ser feita em benefício daqueles que menos têm. Aqui não há distinção ideológica: até o mais liberal dos "neoliberais" defende que os gastos do governo sejam "pró-pobres" -- é o segundo item do Consenso de Washington, diga-se de passagem, logo abaixo de disciplina fiscal (que até os "neobolcheviques" seguem).

Ensaios sobre a normalidade - O contraponto

Contraponto importante aos dois artigos anteriores. É sempre bom lembrar que não existe apenas os "inescrupulosos e ambiciosos capitalistas da indústria farmacêutica", mas as pessoas comuns que buscam o tratamento barato, rápido e, principalmente, sem grande esforço próprio, das pípulas em vez da "cura pela fala".

* * *
São Paulo, domingo, 20 de julho de 2008

"Não há indústria do mal"

Para chefe do departamento de psiquiatria da USP, drogas interferem só no temperamento, e não no caráter

DA REDAÇÃO

O conflito de interesses quanto ao conceito de sanidade mental não se restringe à relação de alguns médicos com a indústria farmacêutica.
Para Valentim Gentil Filho, chefe do departamento de psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, esse é apenas o viés mais comentado do problema.
"O assunto é complexo, eticamente importante e sujeito a um monte de vieses. Há muitos conflitos de interesse; além da indústria farmacêutica, há os interesses políticos, ideológicos, financeiros, de ONGs, de linhas de psicoterapia. Isso em geral não é dito", afirma o professor.
Para Gentil Filho, quando um psicoterapeuta critica o uso de medicamentos, é preciso notar que "também há uma briga de mercado corporativa entre profissionais de saúde". (EGN)

 

FOLHA - Como avalia as críticas ao DSM ("Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais"), segundo as quais ele tem má influência sobre os médicos do mundo inteiro, incluindo novos distúrbios para comportamentos comuns?
VALENTIM GENTIL FILHO
- O DSM é só uma classificação estatística, serve apenas para dimensionar os problemas que aparecem. É para fins quantitativos, e deve ser usado para catalogar; não é um livro-texto.
Infelizmente, em muitos países, inclusive no Brasil, às vezes há confusão, as pessoas o utilizam como manual de ensino.
O DSM evolui com os conhecimentos, com novas definições. O DSM 4 é um avanço em relação ao DSM 3. O mau uso do DSM 3 pode ter gerado distorções -talvez isso seja corrigido na nova versão que está sendo desenvolvida.
O comentário de que o DSM 3 e o DSM 4 levaram à ampliação do diagnóstico psiquiátrico e que isso levou a um exagero de prescrição de medicamentos é uma afirmação freqüente, mas difícil de debater ou comprovar.
Pois, nos últimos 28 anos (o DSM 3 é de 1980), houve disseminação de informações por meios eletrônicos, além da ampliação do conhecimento sobre disponibilidade de recursos terapêuticos, o que contribuiu para um aumento da demanda -as pessoas que sofrem querem ajuda.
E os profissionais de saúde tendem a tentar atender essa demanda.

FOLHA - Em "Timidez", Christopher Lane afirma que a elaboração do DSM foi influenciada pela indústria farmacêutica, legitimando uma "cultura da droga". Há essa cultura no meio da saúde mental hoje em dia?
GENTIL FILHO
- Há uma cultura da droga na sociedade em geral. As pessoas abusam de substâncias desde o tempo do Noé. A indústria farmacêutica não é uma entidade filantrópica nem universitária -vai atrás de seus potenciais usuários.
O difícil é pensar que a medicina é enganada pela indústria farmacêutica, que somos influenciados só por um vendedor ou um congresso. A sociedade procura ajuda; isso sempre existiu, buscou-se a cura nas religiões, em outros procedimentos. Mas quantas pessoas estão sendo medicadas indevidamente por causa da propaganda, quanta psicoterapia é prescrita indevidamente... Isso é muito difícil de saber.

FOLHA - Que exageros já encontrou?
GENTIL FILHO
- Lembro do caso do transtorno de pânico. Alguns diziam que estávamos simplesmente rediagnosticando uma coisa já descrita em 1895 por Freud, sempre abordada como um problema comum de ansiedade e angústia, que a abordagem deveria ser mais relativa à filosofia ou à psicoterapia.
Hoje o transtorno de pânico tem um diagnóstico robusto, uma base bem demonstrada.

FOLHA - E quanto à timidez?
GENTIL FILHO
- Há traços de personalidade que existem há séculos e podem ser influenciáveis por medicação. Se não fosse assim, as pessoas tímidas não beberiam antes de entrar em cena em festivais de MPB, por exemplo.
É possível usar medicamentos para interferir na resposta temperamental. O temperamento depende de regulagem biológica, também. O caráter é muito influenciado pela cultura, mas o temperamento é biologicamente modelado. O fato de haver medicamentos capazes de diminuir a reação não quer dizer que todos devam ser medicados.
Mas, se uma pessoa tem uma timidez patológica, que método deve ser usado? Ou as pessoas devem se autoflagelar antes da ajuda médica?
Se uma pessoa tem timidez patológica, será que deixar de atender a demanda não é omissão de socorro?

FOLHA - Há estatísticas para classificar a timidez?
GENTIL FILHO
- Timidez não é diagnóstico psiquiátrico. O fato de haver um medicamento ou método psicoterápico que ajuda a resolver a timidez não a transforma em síndrome.
Se ela o será um dia, isso dependerá de convenções. Há uma cultura numa das ilhas do Pacífico em que as pessoas não tratam uma certa doença de pele, porque acham que fica bonito.

FOLHA - Então, para o sr., a pessoa pode usar drogas para ter uma qualidade de vida melhor...
GENTIL FILHO
- O que me incomoda é dizerem que a indústria farmacêutica é uma "indústria do mal". Existem recursos para lidar com problemas -álcool, tabaco, chocolate etc.
Como médico, é preciso ter alguma base científica. Os médicos tendem a ser éticos e dizer: "Vale a pena fazer tal mudança de vida" ou "vale a pena tomar medicamento". Esses autores que lutam contra o demônio da indústria farmacêutica não são donos da verdade.

FOLHA - O sr. falou em evitar o "autoflagelo". Adam Phillips trata como erro a idéia de que é possível ser feliz o tempo todo. O sr. concorda?
GENTIL FILHO
- Está errada a colocação. Medicamento não faz ninguém feliz. Diminuir o sofrimento não é trazer felicidade. A felicidade aparece e desaparece de acordo com circunstâncias, é medida em momentos; há felicidade em meio à dor.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2007200805.htm

Ensaios sobre a normalidade - Timidez

São Paulo, domingo, 20 de julho de 2008

Que vergonha...

CLINICALIZAÇÃO DE SENTIMENTOS COMO A TIMIDEZ BENEFICIA APENAS A INDÚSTRIA FARMACÊUTICA, DIZ CHRISTOPHER LANE EM LIVRO LANÇADO NOS EUA; PARA ELE, CONSUMISMO E DESCRENÇA TAMBÉM CORREM O RISCO DE SEREM VISTOS COMO DOENÇAS

DA REDAÇÃO

Pensar antes de falar tornou-se coisa do século 19. A pressão por agilidade que a competitividade capitalista imprime sobre o homem no trabalho -e, por conseqüência, em todas as esferas de sua vida social- gerou novos conceitos de normalidade, sob os quais a timidez e a introspecção não têm lugar.
Para a psiquiatria contemporânea, trata-se de transtornos mentais.
Isso é o que defende o professor de literatura na Universidade Northwestern (EUA) Christopher Lane. Para ele o abandono da teoria freudiana, em meados do século 20, e o desenvolvimento do mercado de antidepressivos fizeram comportamentos até então vistos como comuns serem tratados como transtornos.
Acostumamo-nos à idéia de que ninguém é normal, mas que medicamentos podem nos levar à sanidade.
Lane, que estudou comparativamente a psicologia contida na literatura vitoriana e a ciência contemporânea em livros como "Hatred and Civility" (Ódio e Civilidade) e "The Burdens of Intimacy" (Fardos da Intimidade), concentrou-se na evolução mais recente da classificação das doenças mentais para escrever seu novo livro, "Shyness" (Timidez, Yale University Press, 272 págs., US$ 27,50, R$ 45).
Ele analisa o desenvolvimento do DSM, sigla para "Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais", classificação norte-americana usada como referência internacional para as ciências médicas. Lá, timidez é o "transtorno de ansiedade". Publicado desde 1952, o DSM já teve quatro versões, com cada vez mais categorias.
Para Lane, a versão de número cinco deve conter doenças novas, como "consumismo excessivo", o que representa um risco em sociedades marcadas pela automedicação e, segundo ele, pelo pacto entre cientistas e indústria farmacêutica.
"Nos últimos anos, pesquisadores chegaram a se recusar a publicar pesquisas porque tinham resultados negativos para a indústria. É um sério conflito de interesses." (EGN)

 

FOLHA - Como define a timidez?
CHRISTOPHER LANE
- Eu a definiria como uma forma de consciência de si, às vezes excessiva, que pode resultar em hesitação, atitude estranha e embaraço. É um traço psicológico bem difundido, existindo em cerca de 50% da população. Não é um transtorno psiquiátrico.
A timidez tende a variar enormemente de acordo com o temperamento, a idade e a situação -pessoas gregárias podem ficar tímidas no primeiro encontro com estranhos, e crianças e adolescentes podem se tornar tímidas em idades de mais autoconsciência.

FOLHA - Resumindo a tese de seu livro: os psiquiatras abandonaram Freud e tomaram nada mais que o DSM em seu lugar para explicar as doenças mentais?
LANE
- É algo nesse sentido.
Tento contar um pouco a história da ansiedade e como pensamos nela.
Até 1980, o DSM usava linguagem psicanalítica sobre ansiedade. Usava-se a expressão "neurose de ansiedade". Os americanos estavam insatisfeitos com o uso da linguagem psicanalítica, apesar de ela continuar em uso na Europa e em países como Brasil e Argentina.
Houve nos EUA um guinada em direção à biomedicina e à neuropsiquiatria, portanto tentou-se definir ansiedade em termos puramente biológicos.
É claro que há componentes biológicos: palpitação, suor nas mãos, falta de ar. Descrevo a saída da abordagem psicológica em favor da biomédica, o que levou à conseqüência de que a solução passou a ser o remédio, ao invés de alguma mudança de consciência ou percepção.
Hoje temos muitas indicações sobre os efeitos colaterais e os problemas quando alguém tenta diminuir a dose, como mudanças súbitas de humor ou pensamento suicida.
Quando Peter Kramer escreveu "Ouvindo o Prozac" [ed. Record], ele pensava nas transformações na sociedade de uma maneira totalmente benigna -escreveu antes de muitas descobertas negativas sobre essa droga.
Hoje, escritores e cineastas são mais conscientes dos riscos das drogas, de que pessoas podem considerar, como parte de suas identidades, tais doenças e as drogas a elas associadas.

FOLHA - Mas na cultura pop persistem piadas ingênuas do tipo "está na hora de tomar seu Prozac"...
LANE
- É porque a indústria foi muito eficiente em limitar a publicidade dos efeitos colaterais dessas drogas. Como são elas que bancam a maioria das pesquisas, são brilhantes em ocultar resultados.
As pessoas acham que vão resolver com drogas problemas que, em 80% dos casos, o placebo resolve com a mesma eficácia. E as drogas têm efeitos colaterais.

FOLHA - Essa atitude do consumidor reflete a mudança cultural que recomenda a postura agressiva do mundo dos negócios?
LANE
- É a pressão para ser extrovertido. Há menos ênfase em introspecção, reflexão, escutar e absorver informações.
Como resultado, a idéia de "normal" mudou muito e se estreitou demais. O ideal de extroversão torna-se uma exigência. E quem não é extrovertido se sente estranho, carente de alguma cura. A indústria deveria aliviar o sofrimento, mas gera um novo sofrer.

FOLHA - O sr. conta a história de sua mãe, que, quando criança, imitava um cavalo quando alguém lhe dirigia a palavra. E escreve que seus avós, como muitos pais fariam, esperaram "pacientemente" que ela aprendesse a se relacionar. Vivemos uma cultura da impaciência?
LANE
- Sim. Nossa expectativa sobre outras pessoas e sobre o que a vida oferece se apressou, Há pressão para competir e produzir, e isso tem alto custo em instabilidade para as pessoas. Por isso, não digo que a ansiedade seja um mito.

FOLHA - A depressão recebeu por parte da indústria o mesmo tratamento que a ansiedade?
LANE
- A depressão tem uma história mais longa, mas recebeu um tratamento semelhante, pois a psicologia ficou de lado em favor da questão de quantidade de substâncias no organismo.

FOLHA - E como a mudança cultural afetou o tratamento dado à depressão?
LANE
- Há livros muito bons, como "The Loss of Sadness" [A Perda da Tristeza, de Allan V. Horwitz e Jerome C. Wakefield], que documentam como o DSM simplificou demais a depressão, especialmente o transtorno bipolar. A publicidade transformou "bipolar" em um termo do dia-a-dia.
Os psiquiatras têm uma concepção estreita de normalidade, portanto criam novas doenças, como aquela para quem briga no trânsito, por exemplo [distúrbio de explosão intermitente]. Não digo que seja normal, mas daí a criarem um transtorno específico mostra aquilo que eles aceitam como emoções humanas.

FOLHA - O sr. estudou em "Ódio e Civilidade" o comportamento anti-social. A misantropia virou doença?
LANE
- É uma ação política classificá-la como doença. No século 19, os misantropos eram valorizados por serem pessoas críticas da sociedade.

FOLHA - Que está estudando no momento?
LANE
- Estudando "passive-aggressive disorder" [transtorno passivo-agressivo].
É interessante notar que a linguagem usada no DSM de 1952 vem do jargão militar, de memorandos da Segunda Guerra. Médicos estavam preocupados porque alguns soldados não seguiam ordens, chamando isso de comportamento passivo-agressivo.
Esses dados foram trabalhados e foi criado o transtorno de personalidade com esse nome.
Em 1980, esse rótulo foi usado para descrever sintomas nestes termos: "Pessoas que têm preguiça, que não querem fazer compras ou lavar a roupa". É uma transformação incrível.
Estou também escrevendo sobre a história da descrença, chamada "Failing Gods" [Deuses que Falham].

FOLHA - A descrença logo vai virar doença?
LANE
- Espero que não, é um fenômeno extremamente útil.
Mas há grande chance de que o consumismo ou a descrença logo sejam rotulados como transtornos mentais, o que seria alarmante.
A dúvida é um estado da mente que seria bom reviver.
No século 19, os vitorianos escreviam muito sobre a dúvida: religiosa, científica, social, filosófica, legal. Hoje há a necessidade de revivê-la.
Podemos conceber o fundamentalismo como o pensamento que não admite dúvida, o que é perigoso porque o mundo é cheio de incerteza. Não aceitá-la produz comportamentos extremos, como as pessoas não mais tolerarem umas às outras.
É um problema generalizado -veja, por exemplo, o fundamentalismo cristão nos EUA.

FOLHA - As crianças precisam da timidez assim como da dúvida?
LANE
- Não digo que precisam, mas não devem se sentir doentes por a sentirem. As pessoas têm excentricidades, isso é parte da humanidade. As pessoas são mais felizes quando podem se expressar como são. Um psiquiatra que não tolera as diferenças é arrogante.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2007200803.htm

Ensaios sobre a normalidade - Loucura

São Paulo, domingo, 20 de julho de 2008

De perto, ninguém é normal

EM ENTREVISTA À FOLHA, ADAM PHILLIPS ATACA A GLAMOURIZAÇÃO DA LOUCURA E SUA ASSOCIAÇÃO COM A ARTE E DIZ QUE AS PESSOAS PRECISAM RECONHECER QUE NÃO É POSSÍVEL SER FELIZ O TEMPO TODO

Sean Ellis/Getty Images



ERNANE GUIMARÃES NETO
DA REDAÇÃO

Em um mundo onde o verso "de perto, ninguém é normal" é entoado cotidianamente, a busca pela sanidade mental soa como inútil.
Mas o psicanalista britânico Adam Phillips defende essa "ficção que mantém nossas expectativas". O autor de "Louco para Ser Normal" (ed. Zahar, trad. Maria Luiza X. de A. Borges, 160 págs., R$ 34,90), ataca a glamourização da loucura, mas faz uma concessão: a cultura do "muito louco" teve o mérito de quebrar preconceitos contra os alienados, facilitando a discussão pragmática da questão.
Para Phillips, que coordenou a recente edição das obras de Freud pela editora Penguin, o que se deve buscar não é a completa ausência de problemas, mas uma forma de lidar com eles -e isso inclui perceber outras idéias às vezes esquecidas, como a de que não podemos ser felizes o tempo todo.
Leia abaixo trechos da entrevista, concedida à Folha por telefone, do Reino Unido.

 

FOLHA - O que o levou a escrever "Louco para Ser Normal"?
ADAM PHILLIPS
- Eu o escrevi por uma razão simples. Sanidade é um assunto pelo qual a maioria das pessoas não se interessa.
Contudo há um grupo muito interessado nela: as pessoas que foram loucas ou tiveram parentes loucos. Para os demais, sanidade é enfadonha; para esses, é um tema crucial.
Outra coisa que me interessou foi o fato de que, na Inglaterra, o movimento antipsiquiátrico -pessoas como R.D. Laing e David Cooper- esmoreceu muito rapidamente.
Quando estudei, 30, 25 anos atrás, essas pessoas eram interessantes, iluminadoras. Dez anos anos depois, não se falava mais nelas. E achei que tinham coisas interessantes a dizer.
Portanto foi uma combinação, na medida em que a idéia de sanidade ainda pode ser importante, mas o significado da palavra está morrendo.

FOLHA - Loucura está na moda?
PHILLIPS
- Não. Foi moda, mas foi má idéia fazer dela uma moda. O problema foi que, para as pessoas levarem a insanidade a sério, ela teve de ser glamourizada. Foi transformada numa aventura.
Atualmente, para a maioria, é o oposto: miséria profunda, beco sem saída, sem nada de engraçado.
As pessoas que a tornaram moda foram responsáveis por duas coisas importantes. Os chamados "loucos" passaram a ser pessoas a ouvirmos, com coisas importantes a dizer -não são apenas gente que assusta. Outra coisa: pessoas que parecem ser normais podem ser mais loucas que os loucos.

FOLHA - Sanidade é um mito?
PHILLIPS
- Não um mito, mas uma ficção que mantém nossas expectativas. É uma história ou descrição de estados mentais e modos de ser dos quais podemos ser capazes. É um estado da mente, por exemplo, em que as pessoas não perturbam demasiado umas às outras.

FOLHA - Há uma tradição que trata artistas como "gênios loucos". Isso faz sentido?
PHILLIPS
- Houve a idéia romântica segundo a qual, para ser artista, é preciso ser louco -o que não me parece verdade. O que é verdade é que algumas pessoas que foram artistas foram também pessoas perturbadas e, a partir de seus distúrbios, criaram arte.
Assim, uma das razões para a glamourização da loucura é a associação com os artistas -"deve ser uma coisa boa, já que tantos artistas são bons".
Mas muito da loucura não é criativa, e sim anticriativa.

FOLHA - Pessoas sãs podem ser "legais"? Procurar o equilíbrio é o oposto de ser interessante?
PHILLIPS
- Busquei, no livro, investigar se há uma versão atraente da sanidade -talvez não haja. Mas é possível que ainda não a tenhamos criado, pois a sanidade não é intrinsecamente sem graça.
Mas também acho que precisamos deixar de lado a idéia de "equilíbrio". Sanidade tem muito mais a ver com a capacidade de conter conflitos do que resolvê-los.

FOLHA - Por que devemos, como o sr. diz no livro, nos concentrar na sanidade, e não na doença? Afinal, a sanidade é "invisível", é mais difícil defini-la...
PHILLIPS
- Entendo isso, mas quis mostrar que o problema da sanidade é ser invisível e que é o tipo de coisa dado como certo.
Precisamos descobrir o que acontece quando articulamos nossas idéias de sanidade. Podemos precisar fazer isso para encontrar novas fontes de esperança.

FOLHA - Conhece "Shyness" [Tmidez], de Christopher Lane? Ele diz que a indústria farmacêutica cria drogas para situações que não precisam de cura -como, segundo ele, a timidez. O sr. concorda?
PHILLIPS
- Conheço e concordo.
A indústria farmacêutica tem sido um escândalo. Tem explorado as pessoas. Suas soluções são totalmente falsas. As pessoas deveriam ter muito cuidado com a cultura da droga como solução para as dificuldades de estar vivo.

FOLHA - Concorda que o DSM [manual de classificação de doenças mentais americano, referência mundial] abandonou a teoria freudiana em favor da bioquímica?
PHILLIPS
- Não o tenho estudado, mas parece que todo o etos cultural tem se movido em direção à tecnologia das drogas em detrimento das curas pela fala ("talking cures").
De muitas formas, isso pode ser algo necessário, para que, com o tempo, a cultura da droga mostre que falhou, de modo a voltarmos à curas pela fala. O que a psicanálise tem a oferecer é a idéia de que não podemos ser curados... Não se trata disso.

FOLHA - De que se trata?
PHILLIPS
- De duas coisas: ser capaz de se atrever a encontrar maneiras de conviver e transformar a si próprio. É ser capaz de reconhecer o fato de que -para dizer cruamente- não podemos ser felizes o tempo todo. Qualquer um que esteja completamente desperto sabe que a vida é extremamente difícil. Há uma frase em "Fim de Partida" [ed. Cosac Naify], de Samuel Beckett: "Você está na Terra; não há cura para isso".

FOLHA - E tentamos conversar para aprender o que fazer em seguida?
PHILLIPS
- Sim, ou aprender os limites do que podemos fazer.
A psicanálise mostra a você as coisas que não dá para mudar a seu respeito.

FOLHA - Como traçamos os limites do normal? A timidez não é normal, por exemplo?
PHILLIPS
- Deveríamos esquecer se as coisas são normais ou não e começar a pensar em quais são seus propósitos. Qual é o propósito da timidez para um indivíduo? Não perguntaríamos se é normal, se precisa ser curada, mas, sim: se tal pessoa é tímida, como ela está lidando com essa característica?

FOLHA - Seria um ponto de vista funcional?
PHILLIPS
- Sim. Eu chamaria de visão psicanalítica pragmática.

FOLHA - Sanidade necessariamente se opõe ao hedonismo dos tempos atuais?
PHILLIPS
- Como digo no capítulo "São Hoje", muito do hedonismo de hoje é uma forma de desespero, de desilusão.

FOLHA - No fim do livro, o sr. trata do uso de palavras como "tentação" e "força de vontade". O que pensa sobre a publicidade usar palavras como "tentação" com o fim de vender produtos?
PHILLIPS
- Não gosto disso. Mas a educação precisa acompanhar o que acontece com a cultura. As pessoas deveriam aprender na escola como ler anúncios.

FOLHA - Tivemos, por exemplo, picolés batizados com os nomes dos pecados capitais.
PHILLIPS
- Podemos pensar no que há de maravilhoso na inventividade disso tudo, mas também há a falta de objetivo.
Não precisamos de sete sabores de picolé, por exemplo. Há algo nesse excesso que é uma forma de lidar com um sentimento de empobrecimento que na verdade muitos têm.

FOLHA - Ainda sobre as formas de atender às necessidade psicológicas das pessoas, David Levy, em "Love and Sex with Robots" [Amor e Sexo com Robôs], diz que pessoas com dificuldades de sociabilidade poderão em breve comprar robôs para resolver seus problemas. Esse é um modo correto de procurar a sanidade?
PHILLIPS
- É ridículo. Absolutamente não é o que interessa, é mais problema do que solução.
A questão real é: como as pessoas se tornaram alienadas dos únicos recursos verdadeiros de que dispõem, isto é, um ao outro? Sociabilidade é a característica humana fundamental.

FOLHA - Ele diria que os robôs poderão conversar com as pessoas, logo esse problema estaria resolvido.
PHILLIPS
- Há uma resposta pragmática para isso: robôs são bons para quem gosta de robôs.
Nada contra gostar de robôs; tenho objeção à idéia de que isso seria uma solução para todo mundo.

FOLHA - Como identificar a tentativa de sanidade que "aprisiona" e diferenciá-la daquela que liberta?
PHILLIPS
- A primeira coisa é arriscar. Não podemos saber de antemão qual será. Mas sabemos, sim, se estamos sendo complacentes, quando fazemos algo porque sentimos que deveríamos, ao invés de ser nosso desejo genuíno.
Sanidade, se é que vale alguma coisa, será algo na direção das coisas em que o indivíduo acredita realmente, nas quais está seu coração.

FOLHA - Mas alguém poderia dizer "estou bem com esse sentimento, quero permanecer assim, mesmo que me chamem de psicopata".
PHILLIPS
- Algo é bom desde que não prejudique outras pessoas.

FOLHA - A questão é política?
PHILLIPS
- Certo.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs2007200802.htm

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

As olimpíadas a que assisto

O melhor da ginástica e da comédia: Paul Hunt. Eu só não sei se ele é um p... ginasta que virou comediante ou um p... comediante que virou ginasta. De qualquer forma, nota 10 como ambos.

Ninguém me ajuda a ajudar (4)

É a última de hoje sobre o assunto (eu espero).

Rua Bonitos (ela mesma muito feia, aliás). A rua já é estreitíssima, e a calçada deve ter uns 30 centímetros (o que obriga, quando há poste), a dividir a "pista de rolamento" (aka rua, no jargão da CET) com os carros. Não bastasse isso, três carros estacionados, alguns deles bem debaixo de uma placa de "Proibido Estacionar". Um deles era um carro oficial: Tribunal Regional Eleitoral, nº 0001 (será o presidente do TRE de São Paulo?), parado em frente ao número 61.

Ligo para o 156, o SAC da Prefeitura de São Paulo. Depois de ouvir o menu, teclo 7 para "outras" (se tivesse a opção "cancelar", como os outros SAC terão que ter em breve, eu juro que teclava).

"Quero reportar uma infração de trânsito."

"Como assim?"

"Há uma infração, e eu gostaria que vocês tomassem providências"

"Ah. Qual é a infração?"

"Tem vários carros parados numa rua onde é proibido estacionar."

"O senhor gostaria de abrir um protocolo?"

"(NÃO!!! EU GOSTARIA QUE VOCÊS ACIONASSEM UM DOS 48 GUINCHOS QUE A PREFEITURA COMPROU OU DEVERIA TER COMPRADO --DEPOIS DE QUASE QUATRO ANOS DE INTERRUPÇÃO DO SERVIÇO-- PARA REMOVER OS VEÍCULOS DE LÁ!!! O QUE VOCÊS VÃO FAZER, ADMINISTRATIVAMENTE, PARA QUE ESTA DENÚNCIA VIRE AÇÃO, NÃO ME IMPORTA!!!) Sim."

"Nome completo. RG. Endereço. CEP. Telefone. Tipo sanguíneo. Exame de chapa de pulmão. Capital da Nicarágua."

Só depois de muitas informações pessoais fornecidas é que a moça resolve perguntar o que deveria ter sido a primeira informação fornecida: em que rua eles estão estacionados!!! Se a ligação caísse por qualquer motivo, ela saberia a capital da Nicarágua (Manágua, essa era fácil, meu pai tinha um conhecido que era de lá), mas não o local da infração. E, se eu posso fazer uma denúncia anônima no site da Prefeitura, por que não posso fazê-la por telefone?!

Ninguém me ajuda a ajudar (3)

E por falar no Metrô, louvo a iniciativa de seu presidente, que foi à estação Sé, sem se identificar, para ser o Dirigente de Plantão por alguns minutos (artigo da Folha aqui, só para assinantes). Não foi abordado por nenhum passageiro. Isso é bom? A não ser que a pessoa ache que os serviços prestados ou os produtos vendidos por sua empresa são perfeitos, isso é um mal sinal. No caso do Metrô, pode significar que não haja confiança dos usuários nos canais de denúncia e reclamação.

O programa tem seus méritos, mas o problema do Metrô em ouvir seus usuários persiste. Para cada uma das reclamações que já fiz via Internet, havia sempre uma resposta defensiva, justificando porque as coisas eram daquele jeito. Assim fica difícil melhorar.

Outro dia fiz uma reclamação a uma Dirigente de Plantão na estação São Bento. Era sobre um problema de lâmpadas queimadas na estação, que deixava partes da plataforma na total escuridão havia semanas. O mais irônico da história é que duas das lâmpadas queimadas estavam em frente àquela funcionária. Ou seja: ou não havia da parte dos funcionários da estação comprometimento real para com a melhoria do Metrô, ou a eles não são dadas condições de melhorar os problemas que existem.

O Metrô poderia aproveitar melhor seus funcionários onde eles são mais necessários, e facilitar as reclamações e sugestões dos usuários nas estações com uma medida bastante simples: colocar papel e caneta ao lado das inúmeras "caixas de sugestão" que já existem, e que vivem vazias... (por que será? teremos atingido a perfeição?)

Ninguém me ajuda a ajudar (2)

Um bebê vomitou hoje no chão do vagão do Metrô onde eu estava -- por poucos centímetros não respingou em mim!

Saio na estação seguinte (era a minha, mesmo), e corro para a cabine dos funcionários do metrô, para comunicar o fato --eu espero que o pessoal da limpeza do Metrô não espere o trem chegar até a estação final para fazer isso.

Lá, fico esperando um funcionário prestar atenção em mim. Um deles está com um guia de ruas na mão, ensinando alguém como chegar no seu destino. O outro nem se incomoda com minha presença, fica preenchendo algum formulário mais importante do que qualquer coisa que eu tenha para falar (depois eu descubro que não era urgente: depois ele acaba deixando o formulário de lado, não o entrega para ninguém).

Quando eu grito um "oi!" para o preenchedor de formulário, que não me escuta, o "do guia" pergunta para mim o que eu queria. Explico brevemente, e ele chama a atenção do outro, para me atender. Explico. Ele sai correndo para avisar a próxima estação. Talvez seja tarde: o tanto que ele demorou para me atender, o metrô talvez já estivesse partido novamente da outra estação, com o vômito no chão e o cheiro em todo o vagão.

Ninguém me ajuda a ajudar (1)

Outro dia tentei fazer uma denúncia ao Disque-Denúncia. Não queria me identificar pois, apesar do crime ser --comparativamente-- pouco grave, não sabia se os denunciados eram "barra pesada", nem se um denunciado consegue de alguma maneira ter acesso aos dados do denunciante, caso ligasse para o 190. Não ter confiança no órgão que recebe denúncia é fogo...

Além de furto de energia (um dia eu vi a pessoa fazendo as ligações direto do poste), aquele barraco (não estou menosprezando, é realmente um barraco de madeira) vive promovendo "baile funk", quase todo fim de semana, em frente à janela do meu quarto, começando às 23h e terminando quase de manhãzinha. Não é incomum eu ver jovens (com certeza menores de 18) bebendo -- ah, Fabio, todo mundo faz isso! Então tá, desculpa aê, pensei que fosse proibido... E, se não bastasse, os taxistas do ponto perto de casa disseram que aquela viela onde fica o barraco em questão é boca-de-fumo. Não duvido, tem realmente muita movimentação suspeita por lá.

Como se pode ver, minhas informações não são precisas, não tenho descrição física dos criminosos (furto de energia é crime) nem sou testemunha ocular de tráfico de drogas (os taxistas têm, e costumam negar corrida quando o potencial cliente pede para ir para lá e tem cara/comportamento de usuário/comprador). "Baile funk" não é crime, mas som altíssimo, é (só não sei se vale apenas para estabelecimentos comerciais).

Resumo da ópera: a atendente do Disque-Denúncia me fez sentir um típico "branquelo riquinho preconceituoso" que estava simplesmente incomodado com o barulho de uma festinha de gente pobre, e que exagerava o problema para chamar a atenção das autoridades. Para tudo, ela queria informações mais detalhadas. "Não sei o nome da rua, é uma viela, não existe no mapa formalmente"; "não, não sei o número do barraco -- nem deve ter!"; "não, não vi drogas sendo comercializadas, é apenas informação que circula pelo bairro, alguém precisa investigar".

Sim, eu sei, quanto mais informação, melhor! Mas a polícia deveria se contentar com qualquer ajuda que a população se voluntariar a fornecer a ela, e trabalhar com o que tem. Algo é melhor que nada. E, se a população vir a polícia trabalhando, investigando, capturando criminosos, aumentará a confiança daquela nesta, e o número de informações fornecidas pela população tente a aumentar. Foi assim em vários lugares (ler dois ótimos livros da Coleção Polícia e Sociedade da EdUSP, "Nova Polícia: Inovações nas Polícias de Seis Cidades Norte-Americanas" e "Policiamento Comunitário: Questões e Práticas Através do Mundo" -- se quiser, empresto).

Outra coisa que o Disque-Denúncia (ou aquela atendente em particular) peca por não entender: as chamadas "ofensas contra a qualidade de vida", como barulho de motocicletas que ficam rodando pelo bairro por diversão, as festas barulhentas, as pequenas depredações urbanas etc., tudo isso diminui o vínculo afetivo que os moradores têm com a região onde moram, e diminuem a predisposição desses moradores para acionar as autoridades no caso de outras violações (ler o ótimo "Disorder in Urban Neighborhoods: Does It Lead to Crime?"). Cuidar desses crimes ou infrações que parecem "pequenos" faz com que a população coopere para que a polícia resolva os crimes "graúdos".

Mas não. Eles conseguiram me fazer sentir culpado por fazer uma denúncia. Parabéns, Disque-Denúncia: um denunciante a menos!

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Mais dinheiro, mesma cultura

Que bom que existem pessoas que conseguem dizer o que eu penso de maneira muito mais bem articulada do que eu. Esta é, talvez, minha sina: writing by proxy...

* * *


São Paulo, quarta-feira, 13 de agosto de 2008


FERNANDO RODRIGUES

"Posso olhar aí, tio?"

BRASÍLIA -
O Brasil, fui informado, virou um país de classe média.
Percebi um pouco a mudança na segunda-feira ao renovar uma credencial de imprensa no Congresso. Entrei na repartição e três funcionários públicos conversavam felizes sobre suas vidas privadas em uma rodinha. Ignoraram-me por alguns instantes. Dois outros "concursados" tagarelavam ao telefone, inclusive o responsável pelo atendimento -este descrevendo a argamassa e o azulejo comprados para reformar "o lavabo".
Todos parecem estar com mais dinheiro no bolso. Mas a eficiência continua a de sempre.
Volto a este espaço depois de um ano fora do país. Percebo uma efervescência na economia. Na Starbucks da alameda Santos, em São Paulo, serviram-me um pedaço de bolo em prato de louça e com um garfo de metal. Nos EUA, seria num saquinho de papel descartável e se comeria com as mãos. Esse deve ser mais um item do custo Brasil.
Nem FHC nem Lula decifraram um enigma crucial: a fórmula para combinar crescimento econômico com aperfeiçoamento dos valores e costumes gerais do brasileiro. Na padaria do bairro, aqui em Brasília, o mesmo guardador de carro de 12 meses atrás continua a recepcionar a todos de maneira idêntica, com a pergunta/ameaça "posso olhar aí, tio?". Ele já é parte da paisagem.
Ninguém se incomoda. O Brasil está em geral mais rico. A classe média foi às compras. Carros são vendidos em 46 prestações. Ótimo. Mas a ineficiência nos serviços públicos está intacta. Médicos são formados sem saber como tratar um paciente com resfriado. As calçadas das principais capitais são imundas. Entra-se num táxi em São Paulo para ir até a avenida Paulista e o chofer despreparado pergunta: "Qual o melhor caminho?".
O Brasil é um país de classe média. Vá lá. Mas tem um caminho longo para vir a ser uma nação desenvolvida.

frodriguesbsb@uol.com.br

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1308200804.htm

Finding Paths Through the World's Photos

University of Washington and Microsoft Research collaborates on (yet another) mindblowing 3D photo viewer. It's the evolution of Photosynth:

Finding Paths Through the World's Photos


Pareceu que falta, ainda, poder de computação gráfica (talvez eles não estivessem usando um quad-core com 8 GB), ou talvez uma banda mais larga de Internet para ler rapidamente as fotos do Flickr, mas os conceitos e potenciais da ferramenta são bastante interessantes.

Depois é só fazerem um mesh-up com o Google Maps, e finalmente eu poderei passear virtualmente pelas várias cidades do mundo... (para planejar melhor minhas viagens, e para fazer um "next best thing" nas várias cidades que certamente não chegarei a conhecer -- seja por tempo ou por dinheiro)

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Segurança Pública e pagamento por resultado

Mensagem
O princípio é interessante, tanto o de premiar a delação efetiva (que resulte em apreensão) quanto o de pagar a polícia "por resultado" (dobrando o prêmio nas operações em que não houver violência).

Como garantir que as armas apreendidas não voltem para as ruas? Corre-se o risco de pagar várias vezes pela apreensão das mesmas armas.

Mas no meio do texto o esquema já ficou parecendo coisa da Amway:

A recompensa é paga em cupons -chamados Top Premium- que podem ser trocados por mercadorias ou serviços na rede de estabelecimentos credenciados.
O "bônus" pela operação bem-sucedida sem violência também é fundamental. Lembremos da "premiação faroeste", ou condecoração por bravura, instituída no governo Marcello Alencar: o critério básico de distinção era o números de bandidos mortos em ações policiais.
 
* * *
São Paulo, sábado, 2 de agosto de 2008
 
Apreensão de fuzil rende 2 meses de salário a PM do Rio

Instituído pelo Disque-Denúncia dentro do programa Desarme o Bandido, prêmio vale para fuzil, metralhadora ou submetralhadora

Policial tem direito a R$ 1.000, mas valor pode dobrar; quem ligar para o serviço indicando a localização também recebe R$ 1.000

FÁBIO GRELLET
DA SUCURSAL DO RIO

Um soldado da Policia Militar do Rio ganha por mês salário inicial bruto de R$ 909,49, mas, se apreender um fuzil, uma metralhadora ou uma submetralhadora, pode receber de uma só vez até R$ 2.000 -mais de duas vezes o próprio salário.
O prêmio foi instituído no mês passado pelo serviço Disque-Denúncia como parte do programa Desarme o Bandido. Quem ligar para o serviço indicando a localização de qualquer dessas armas também é recompensado: recebe R$ 1.000, desde que a denúncia resulte na apreensão do equipamento.
O policial que localizar e apreender qualquer dessas armas tem direito a R$ 1.000, independentemente das condições em que a apreensão ocorrer. Mas o prêmio pode dobrar se atendidos três requisitos: a apreensão for conseqüência de um aviso apresentado ao Disque-Denúncia, a operação for divulgada pela imprensa e não houver violência. Em todos os casos, o prêmio depende da confirmação, por meio de perícia, de que a arma esteja em condição de uso.
A recompensa é paga em cupons -chamados Top Premium- que podem ser trocados por mercadorias ou serviços na rede de estabelecimentos credenciados.

Mais apreensões
A premiação multiplicou a apreensão de armas: em julho, primeiro mês da campanha, foram localizadas dez armas. Em todo o primeiro semestre haviam sido 19, média de 3,1 por mês. Em 2007 haviam ocorrido 17 apreensões. Nessa época, o prêmio de R$ 1.000 aos denunciantes já existia, mas a polícia não recebia recompensa nenhuma.
Das dez apreensões de julho, três tiveram origem em denúncias anônimas e outras sete foram localizadas por policiais sem auxílio de ninguém.
"Vamos pagar R$ 16 mil pelo resultado de julho", afirma Zeca Borges, coordenador do Disque-Denúncia. Desse valor -que, segundo Borges, será entregue até 10 de agosto-, R$ 13 mil caberão a policiais e R$ 3.000 a autores de denúncias.
Para entregar os prêmios sem identificar o autor da acusação, como é regra no Disque-Denúncia, serão agendados encontros em lugares de grande movimento, como shoppings e agências bancárias. "Qualquer técnica para identificar a pessoa sem precisar saber seu nome será válida: usar senha, avisar a roupa que a pessoa estará vestindo, coisas assim", diz.

"Caçadores"
Não são apenas armas que rendem recompensas oferecidas pelo Disque-Denúncia. Informações que levem à prisão de Antônio de Souza Ferreira, o Tota, apontado pela polícia como o chefe do tráfico no complexo do Alemão, valem R$ 10 mil. E até um balão pode render de R$ 300 a R$ 1.000. O dinheiro é doado por particulares. O serviço já chegou a oferecer R$ 100 mil pela captura de Fernandinho Beira-Mar, mas ninguém fez jus a esse valor.
"Quando entregamos o prêmio, aconselhamos as pessoas a não virarem caçadoras de recompensas", afirma Borges. "E, como não queremos que alguém substitua o trabalho da polícia, ninguém pode levar a arma diretamente à polícia. É preciso ligar para nós, para que a gente acione os policiais."
No mercado ilegal do Rio um fuzil vale até R$ 30 mil, estima o governo. Mas o coordenador do Disque-Denúncia não teme que alguém prefira comercializar as armas com bandidos. "Não podemos pensar dessa forma. Não vamos negociar com bandidos, mas sim premiar pessoas honestas."

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

El 'dossier' brasileño

Para quem ouviu falar sobre essa reportagem no Bom Dia Brasil de hoje, segue o link para o texto integral:

El 'dossier' brasileño
El computador de 'Raúl Reyes' revela que los vínculos de las Farc con altos funcionarios del gobierno de Brasil, entre ellos cinco ministros, llegaron a niveles escandalosos.
http://www.cambio.com.co/portadacambio/787/ARTICULO-WEB-NOTA_INTERIOR_CAMBIO-4418592.html

Minhas fontes colombianas me informaram que a revista Cambio é tida como respeitável e equilibrada -- em nada parecida com a nossa Veja, portanto.