[...] Obama, o vencedor, teve cerca de 3,5 milhões de doadores diferentes. Desses, pelos menos 2,5 milhões deram quantias inferiores a US$ 200 cada um. Como comparação, ao ser reeleito presidente em 2006, o petista Lula teve 1.319 doadores (e 1.634 doações). O tucano José Serra ganhou o governo de São Paulo com apenas 55 doadores diferentes.
Não acho um "despautério" o financiamento público de campanha, como afirma Fernando Rodrigues no final do ótimo op-ed abaixo (talvez ele estivesse se referindo ao financiamento exclusivamente público). Aliás, mesmo nos EUA se discute o "rabo preso" dos políticos com grandes doadores.
A estratégia de Obama de buscar a pulverização das doações de campanha e, eleito, de evitar a contratação de lobistas para cargos de confiança na Casa Branca, reduziu parte considerável do poder de barganha desses grandes grupos de interesse organizados que marcaram a Era Bush.
Ainda assim, o espectro do interesse privado prevalecendo sobre o interesse público ainda sobrevoa a política americana, da nacional à local -- quando estava em Austin, a desconfiança da população sobre a influência de empreiteiros nas decisões de desenvolvimento urbano do City Council daria inveja a qualquer paulistano diante dos descalabros da nossa Câmara de Vereadores.
Antes de responder "quem paga a conta?", é preciso se perguntar por que as eleições brasileiras são tão caras, absoluta e comparativamente falando. ¹ ²
Enquanto não tivermos um mínimo de demonstração de bons tratos com o dinheiro público por nossos políticos, será impossível para o Brasil conceber doações eleitorais individuais de seus eleitores alla Obama.
¹ "Real-politik: Why elections, even to lowly office, are so expensive", The Economist, 25/9/2008. (Link)
² SAMUELS, D. (2001). Money, Elections, and Democracy in Brazil. Latin American Politics & Society, 43(2): 27–48, Jun/2001. (Link1, Link2)
* * *
São Paulo, quarta-feira, 6 de maio de 2009
FERNANDO RODRIGUES
Preguiça cívica
BRASÍLIA - Uma característica marcante da eleição presidencial dos Estados Unidos no ano passado foi a insistência diária dos candidatos pedindo dinheiro. Na TV, rádio e internet, Barack Obama e John McCain quase imploravam por doações. Receberam muito.
O democrata Obama, o vencedor, teve cerca de 3,5 milhões de doadores diferentes. Desses, pelos menos 2,5 milhões deram quantias inferiores a US$ 200 cada um. Como comparação, ao ser reeleito presidente em 2006, o petista Lula teve 1.319 doadores (e 1.634 doações). O tucano José Serra ganhou o governo de São Paulo com apenas 55 doadores diferentes. Os dados são oficiais, do TSE.
Nesta semana, a Folha revelou que as empresas doadoras de campanha têm depositado vigorosamente nas contas bancárias dos partidos políticos. Ocultam assim os nomes dos candidatos receptores de recursos na ponta final.
O TSE pretende apertar os controles. Nenhum partido considerou positiva a iniciativa da Justiça Eleitoral. Querem opacidade nas contas de campanha.
Não ocorre a nenhuma agremiação política ajudar a criar uma cultura da doação financeira durante os períodos eleitorais. Trata-se de uma forma clássica de incentivar a participação dos cidadãos na vida partidária. Quem doa R$ 10 ou R$ 20 a uma legenda ou candidato fica comprometido. Cobrará responsabilidade dos eleitos.
Aí está o problema. Os políticos querem distância dos eleitores interessados em cobrar promessas.
Poucos -se é que ainda existe algum- tampouco teriam coragem de aparecer em público pedindo dinheiro para suas campanhas. O mais fácil é se acomodar na habitual preguiça cívica. Defender o financiamento público exclusivo e, enquanto não cola esse novo despautério, receber dinheiro camuflado por meio dos partidos políticos.
frodriguesbsb@uol.com.br
URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0605200904.htm
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