terça-feira, 24 de agosto de 2010

Corrida ao fundo do poço

Comentários ao final.

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São Paulo, terça-feira, 24 de agosto de 2010


FERNANDO DE BARROS E SILVA

Expresso Tiririca

SÃO PAULO - Se a política é uma palhaçada, vote no palhaço. Resumida a seu cerne, é essa a mensagem em torno da qual Tiririca faz sua campanha para deputado federal pelo PR de São Paulo. O Congresso seria um circo, e o "abestado" pede seu espaço no picadeiro.
"O que é que faz um deputado federal?", pergunta o humorista. E responde: "Na realidade eu não sei, mas vota em mim que eu te conto". Seu bordão mais famoso diz: "Vote no Tiririca, pior do que tá não fica". Tornou-se um sucesso instantâneo.
Ao fazer da desmoralização da política uma bandeira, razão e causa da sua candidatura (disposta a "avacalhar o avacalhado"), Tiririca se põe, à primeira vista, como mais um herdeiro do "voto Cacareco".
Era, como se sabe, o nome do rinoceronte do zoológico paulistano que recebeu, em fins dos anos 1950, mais votos do que qualquer outro candidato a vereador, tornando-se um caso célebre de voto nulo e por isso sinônimo do voto de protesto.
Mas Tiririca não está no zoológico. Ele é um "puxador de votos", a estrela do programa do PR. Sua galhofaria se destina a eleger -aí sim- uma boa bancada de rinocerontes do PR, o antigo PL, partido do mensaleiro (e também candidato) Valdemar Costa Neto. Tiririca não é um palhaço, é um biombo. Atrás dele, vão os verdadeiros artistas do circo fisiológico que o lulismo (e agora Dilma) alimenta.
Se você reparar na campanha do idiota útil na TV, verá que a propaganda exibe o nome de Mercadante, candidato a governador de SP. Tiririca não é, pois, um "outsider", uma aberração avulsa do processo eleitoral, mas alguém estrategicamente patrocinado pelo bloco que detém hoje o poder hegemônico.
Escarnecendo da política para dela se beneficiar, Tiririca é menos uma ameaça individual do que a face caricata de um sistema político que se tornou imune aos escândalos em série que fabrica. Ele de certa forma realiza a profecia de Delúbio Soares, para quem o mensalão um dia iria virar "piada de salão".

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2408201003.htm

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Lembrando que, se Tiririca é o Expresso 2222, o menestrel Juca Chaves é 2200.

Impossível tornar mais clara a estratégia do Partido da República de eleger outros deputados da sigla — de outra forma talvez inelegíveis — por meio das sobras eleitorais.

O cenário que por ora se anuncia para 2011 é tenebroso. O PMDB aparentemente chegará ao poder forte como nunca, unido não por uma agenda programática, mas pela expectativa de receber ministérios (e estatais) de "porteira fechada".

A oposição (por quem tampouco morro de amores) encolherá ainda mais, enfraquecendo o sistema de freios e contrapesos tão caro à democracia. Gente do calibre do Tiririca (como, antes, do Clodovil) certamente estará presente na próxima legislatura do Congresso Nacional (e das Assembléias Legislativas).

Outro importante mecanismo de freios e contrapesos aos excessos da política, a imprensa, sofre para se adaptar à era digital e encolhe redações, aumentando a dependência de agências de notícia e prejudicando a cobertura independente e o jornalismo investigativo. Ao mesmo tempo, não goza lá de muita popularidade no imaginário popular (é forte a idéia de elitismo e de terem um projeto político próprio) e, se não bastasse, também tem sofrido seguidas tentativas de intimidação tanto pelo Estado brasileiro (o Estadão segue sob censura há 389 dias) quanto pelo governo, sob pretexto da "democratização da comunicação".

Pior do que está não fica? Clamo para que não tentemos descobrir.

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