sexta-feira, 28 de maio de 2010

Piorar para melhorar?

Artigo do Marcelo Coelho sobre o trânsito em São Paulo que saiu na Folha de ontem. Legal da parte dele ter publicado em seu blog minha resposta.

Quem lê minha resposta, aliás, pode pensar que gostei da medida da Prefeitura de restrição das vagas de rua para carros. A resposta completa é mais complicada: acho que ela vai melhorar a fluidez, sim, mas que isso vai estimular ainda mais carros a saírem de suas garagens no médio/longo prazo, piorando ainda mais o trânsito da cidade.

É o chamado paradoxo de Braess:

Adicionar capacidade extra a uma rede, quando entidades móveis escolhem seu trajeto livre (egoisticamente), pode em alguns casos reduzir o desempenho geral. Isto ocorre porque o 'Equilíbrio de Nash' de tal sistema não é necessariamente o ótimo.

A visão futurística do que São Paulo está se tornando eu já apresentei aqui neste blog, reproduzindo a bela sátira da Revista Piauí (ver especialmente a galeria de imagens!).

E o oposto, diminuir o número de "pistas de rolamento"? Quem vai ser o louco a propor isso para melhorar a mobilidade urbana?

Louco número 1: Seul, Coréia do Sul

Cheonggyecheon é uma 23 de maio invertida: em vez de asfaltar o córrego Itororó e criar mais "porta-trânsito", os sul-coreanos fizeram de uma avenida um muito simpático córrego:


Resultados: Seul ficou muito mais bonita (ver acima); "refrescante" (a temperatura nos arredores de Cheonggyecheon é cerca de 3,6 °C ao resto da cidade); e a velocidade do trânsito nos arredores do córrego aumentou (pessoas trocaram carros por transporte público).

Louco número 2: Nova Iorque, Estados Unidos

Em 1990, o prefeito nova-iorquino Dinkins promoveu uma grande revitalização da Times Square, uma região então bastante degradada da Grande Maçã. Como parte da iniciativa, fechou para circulação de veículos a rua 42, freqüentemente congestionada. Todos esperavam o caos, mas a circulação no centro de Manhattan... melhorou!

Em 2009, o prefeito Bloomberg repetiu a experiência (na verdade, idéia da comissária de Transportes da cidade, a visionária Janette Sadik-Khan), fechando partes da avenida Broadway para carros. O nova-iorquino respondeu ocupando a grande avenida com pedestres e ciclistas. Não apenas melhorou o trânsito, mas o comércio dos arredores, e a qualidade de vida do nova-iorquino em geral.


Seria demais pedir um pouco mais dessa "loucura boa" para os governantes daqui de Pindorama?

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Kant para as massas

"Quando me perguntam se entendi o que Mockus disse, eu digo que sim, para não parecer ser mais burro do que sou. Mas não entendo. Queria ver suas propostas concretas."

As semelhanças são impressionantes!

* * *
São Paulo, sexta-feira, 14 de maio de 2010 

Mockus alia filosofia a autoajuda na Colômbia

Empatado em 1º lugar nas pesquisas, candidato à Presidência colombiana leva "Kant para as massas" em campanha pelo interior do país

Comícios do político do Partido Verde parecem sessões de terapia de grupo; penetração de discurso entre os pobres é pequena 


FLÁVIA MARREIRO 
ENVIADA ESPECIAL A MANIZALES E PEREIRA (COLÔMBIA)

Nos comícios da campanha do Partido Verde à Presidência da Colômbia, o candidato Antanas Mockus é uma mistura de sacerdote kantiano e instrutor de terapia de grupo. "Agora, vire para seu vizinho e diga a ele: "Sua vida é sagrada'", pediu, sobre um palco modesto na praça principal da cidade de Pereira, centro do país, na última terça-feira. 
O burburinho correu pela plateia de estimadas 4.000 pessoas. Os jovens -a grande maioria- obedeciam a instrução e aplaudiam. "O mandamento é "não matarás", e não: "não matarás enquanto estiver sendo bem atendido'", pregava Mockus. 
A insistência no valor em si das normas morais, do imperativo de que sejam universais independentemente das circunscunstâncias, reverberava a ética do filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804) Kant para as massas? "Sinto-me honrado com essa descrição", respondeu à Folha Mockus, que também é filósofo, além de matemático. 
Mockus, então, propõe um exercício. Dois voluntários sobem ao palco e, com ele, fazem a "dinâmica da confiança": deixar-se abandonar nos braços do companheiro. Como numa oração, todos repetem que "um dia" três colombianos quaisquer confiarão uns nos outros como ali. Mais aplausos. 
O conjunto faz da cena algo inusual para a política latino-americana e para a colombiana em particular -país com histórico de clientelismo, ferido pelo mais longo conflito armado da região.
Poderia ser mais uma campanha que arregimentasse o voto de protesto, mas Mockus tem chances reais de chegar à Presidência. 
O candidato do Partido Verde está empatado com o nome governista, o ex-ministro da Defesa Juan Manuel Santos, nas projeções para a votação de 30 de maio. Mockus levaria no segundo turno, por pouco. 
Boris Salazar, professor da colombiana Universidade do Valle, explica que há 16 anos Mockus faz a pregação ética na Colômbia marcada por escândalos e corrupção. Não perdeu sua reputação de austero e honesto nas duas elogiadas administrações à frente de Bogotá. 
O candidato propõe uma plataforma de economia e de segurança bastante próxima da do atual governo. Tudo isso, num momento de incertezas ante a impossibilidade legal de o popularíssimo Álvaro Uribe concorrer a um terceiro mandato, deflagrou a "maré verde". 
"Mockus é pioneiro nessa política do século 21, que não apresenta grandes propostas, mas se conecta com o padrão mental do eleitor, que quer se identificar com o candidato, vê-lo como crível em seus valores. Muitos colombianos veem Mockus como um professor", afirma Salazar. 
Até suas famosas excentricidades -como casar num circo montado num elefante- e a "gestualidade exagerada", segundo Salazar, fazem parte de "seu capital de autenticidade". 

Candidato pop e Facebook 
Mockus, 58, é um homem frágil, tem olhos de um azul suave. Anda devagar. Sua voz não alcança grande potência nem ao microfone. Define-se como de "estilo pouco assertivo" e causa alvoroços diários na campanha por suas declarações, consertadas depois por "o que eu quis dizer foi..." 
Num dos dois dias em que a Folha acompanhou sua caravana pelo interior da Colômbia, o alvoroço foi a entrevista de rádio na qual Mockus disse que um dos seus pecados era "desejar a mulher do próximo" na católica Colômbia, que já debate suas credenciais religiosas. "Viram o que ele disse? Lá vamos nós", reclamava, bem humorado, o também ex-prefeito de Bogotá Luis Enrique Garzón, diretor político da campanha. Ele senta-se ao lado de Mockus nas coletivas de imprensa e puxa o microfone para si quando necessário. 
"Mockus é o Beethoven do século 21, eu sou o Calle 13 do grupo", fala em referência ao reggaeton político e incisivo do grupo porto-riquenho. "Mockus é de centro-direita. 
Tive de abrir mão de parte da minha agenda de esquerda para estarmos juntos. Mas, na Colômbia de hoje, com a guerrilha e o governo da Venezuela, não há espaço para a esquerda. Ele me fez entender que revolucionário mesmo é propor ética, acima de tudo", derrama-se. 
Filho de lituanos que migraram para a Colômbia, Mockus tem uma barba esquisita. Não há nada em parte do queixo e tampouco há bigode, o que lhe dá um ar imediato de um quadrinho que ganhou vida. Não à toa ele virou um ícone pop rápido: há camisetas de todo tipo. No Facebook, designers competem para ver quem faz o melhor cartaz da campanha. O jingle oficial também é uma produção dos voluntários. 
"Quem chegou aqui por meio do Facebook?", ele pergunta, e a plateia vibra. As redes sociais, segundo vários analistas, estão na base da chamada "maré verde", mas demonstram também seus limites. 
Mockus fala pouco para os 45,6% de colombianos pobres. Na caravana pelo chamado "eixo do café", região deprimida pela crise do grão e também pela queda no comércio com a Venezuela, não houve paradas nas periferias. Nenhuma proposta para criação de empregos. A lacuna foi resumida por José Soares, 55, taxista de Manizales, a primeira parada da turnê. "Quando me perguntam se entendi o que Mockus disse, eu digo que sim, para não parecer ser mais burro do que sou. Mas não entendo. Queria ver suas propostas concretas." 

Veja audiogaleria da enviada especial à Colômbia 

www.folha.com.br/1013310

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1405201009.htm

terça-feira, 11 de maio de 2010

A mulher do próximo

Candidato colombiano Mockus diz que deseja mulher do próximo

* * *

Até os dias atuais muitas pessoas quando escrevem o numero 7 ainda o fazem utilizando uma barra horizontal (traço) suplementar na metade do algarismo.

Oficialmente este pequeno traço não existe, como dá para constatar digitando a tecla 7 do seu teclado de micro, calculadora ou qualquer outro aparelho que possua teclado. Agora eu te pergunto: Você sabe a origem desse costume?? 

Para responder temos que voltar muitos séculos atrás, aos tempos bíblicos, quando Moisés estava no Monte Sinai e lhe foram transmitidos os 10 mandamentos.

Ele, em voz alta, os foi dizendo à multidão, um por um. Quando chegou no mandamento número 7, Moisés anuncia: 

"Não desejarás a mulher do próximo". 

Um breve silêncio e a multidão grita em coro: 

"Risca o sete, risca o sete"!

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Ciência e religião

Trecho da entrevista de Daniel Dennett na Folha de hoje:

FOLHA - Em "A Perigosa Ideia de Darwin" o sr. diz que, ainda que não seja possível ou sensato rezar para o Universo, a ciência proporciona uma espécie de assombro transcendental diante dele. Nesse ponto, a ciência e a religião não se aproximam? 
DENNETT - Sim, eu acho que a melhor ideia da religião é encorajar uma certa modéstia, um respeito e uma reverência pela natureza neste incrível Universo que nós habitamos. E, claro, isso remonta diretamente a [Baruch] Spinoza [filósofo holandês do século 17], para quem o caminho para estudar Deus é estudar a natureza. Acho que o respeito e o amor por este mundo maravilhoso no qual existimos, que pode nos inspirar a melhorá-lo para outras pessoas, é a melhor mensagem da religião, e a ciência pode compartilhar esse sentimento.

Apesar do ranço do "ateu militante" (à lá Dawkins) nas outras respostas, estamos de acordo no trecho acima. Aliás, outros dois ótimos programa que ouvi neste fim de semana me faz pensar que o caminho, a base para o diálogo e de superação da tensão entre religião e ciência, seja exatamente esse:

NPR: This I Believe
There Is More To Life Than My Life

Point of Inquiry
Elaine Howard Ecklund: How Religious Are Scientists?

O primeiro me mostrou uma maneira bastante natural, serena, e até poética, de lidar com a morte. Como não acreditamos num "depois" consciente, um reencontro com os entes queridos perdidos (família, amigos, animais de estimação), nosso processo de superação de uma perda é muito mais lento e doloroso (até hoje me afeta muito a morte de um grande amigo em 2001). Também reforça meu senso de responsabilidade para com o planeta. Ouçam: tem apenas 5 minutos, e é muito bonito.

O segundo link parece mostrar que os "novos ateus" (os cientistas ateus militantes) podem estar errados em sua estratégia: talvez precisemos de mais cientistas religiosos, e não menos. Esse tem +/- 1 hora de duração, mas é igualmente bom, e pano pra manga para muita reflexão e debate.