terça-feira, 16 de setembro de 2008

esbórnia na Câmara paulistana

Há uns 10 anos, a falta de atenção para esse problema foi o que me motivou a cancelar minha assinatura da Folha. Ela estava vendendo jornal a rodo com a cobertura do escândalo da "máfia dos fiscais", mas só no final daquele mesmo ano é que eles foram noticiar sobre o trabalho regular da câmara, dizendo que o primeiro projeto de lei do ano havia sido votado na cidade (final de novembro). Se acompanhassem melhor o trabalho dos vereadores, talvez houvesse menos escândalos. Mas esse não parecia ser o desejo da Folha. Será que agora o é? O editorial abaixo é too little too late.

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São Paulo, terça-feira, 16 de setembro de 2008


Editoriais

editoriais@uol.com.br

Os balcões da Câmara

CAMPANHAS de incentivo ao voto afirmam que é importante escolher bem os vereadores porque eles propõem leis para beneficiar o cidadão e fiscalizam o Executivo. Não na maior cidade do país.
Como mostrou reportagem desta Folha, a Câmara de São Paulo é palco de um jogo de aparências que deixa de lado o interesse dos eleitores e se traduz na semiparalisia da atividade legislativa. Na atual legislatura, um em cada cinco projetos apresentados pelos vereadores foi vetado por ser considerado inconstitucional. Em 2007, quase 80 % dos projetos sancionados se referiam a iniciativas de menor relevância, como homenagens.
A prática não é nova: a prerrogativa de legislar é transferida ao prefeito. Nos últimos oito anos, 80% dos projetos apresentados pelo Executivo foram aprovados. Longe de incomodar as correntes majoritárias na Casa, o fenômeno ocorre pela comunhão de interesses entre a maioria parlamentar e o Executivo.
Na Câmara paulistana são formadas bancadas sem lógica programática ou partidária, que têm por finalidade apenas aumentar o poder de barganha no Executivo. Entre os vereadores, predominam relações pessoais. Grupos políticos são constituídos mediante ligações familiares, e na metrópole mais rica do país ainda é disseminada a velha prática do favor paroquial, do coronelismo e dos currais eleitorais.
Com tantas brechas para abusos e desvios, não espanta que a fiscalização seja deficiente. Criada em 2003, depois do escândalo da "máfia dos fiscais", a Corregedoria nunca puniu vereadores.
Se falta disposição de investigar e de legislar na Câmara paulistana, sobra cobiça por um dos 55 postos na vereança. A um mês do pleito, a arrecadação declarada dos vereadores que tentam a reeleição já é 22% maior do que o montante obtido em 2004. Nisso não há paralisia.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1609200802.htm

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Muitas dúvidas, poucas respostas

Por que tem tanta gente que responde só uma quando eu faço múltiplas perguntas numa mensagem de e-mail?

Elas conscientemente escolhem ignorar as demais, ou o déficit de atenção da sociedade moderna já é tão grande que elas esquecem das perguntas anteriores?

Peça de teatro do dia: 7 minutos, com Antonio Fagundes.

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Où est mon fichier? Voilà!

http://media.economist.com/images/economist_logo.png

Thanks for the memory

Sep 10th 2008
From Economist.com

A mathematical trick may allow people to scatter their computer files across the world's hard disks

IF YOU have lots of unused storage space on your hard disk, then why not share it with others on the internet? The benefit could be distributed storage for your own files, making them available any time via the web, even if you are nowhere near your computer—indeed, even if your computer is switched off. That desideratum is what a Zurich-based firm called Caleido is aiming to provide, with a free online storage service known as Wuala that was recently introduced to the public.

Though the idea underlying it is simple, Wuala requires some nifty technology to make its distributed system work reliably. In particular, its developers, Dominik Grolimund and Luzius Meisser, have used a clever mathematical trick to compensate for the fact that the participating computers will come and go from the internet in an unpredictable way.

The challenge is how to minimise the number of copies of the same file that have to be distributed. Copying costs participants both storage space and bandwidth. Yet there have to be enough copies to ensure that there is at least one available most of the time. If, for example, each computer is online 25% of the time, then a quick calculation shows that you would have to copy each file to 100 different computers to ensure that 999,999 times out of a million there is at least one copy available when a user looks.

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segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Lula&



São Paulo, segunda-feira, 8 de setembro de 2008


FERNANDO DE BARROS E SILVA

Só dá Lula

SÃO PAULO
- A menos de um mês das eleições, o que até agora as campanhas municipais mais evidenciam é a popularidade de Lula, que alcança patamar espantoso mesmo em São Paulo, cidade que sempre lhe foi hostil e na qual em 2006, para ficar só no passado recente, foi derrotado por Alckmin (54,4% a 45,6%), apesar da vitória acachapante em âmbito nacional (de 22 pontos). Pois Lula tem agora 52% de aprovação na capital, contra 42% de José Serra, diz o Datafolha.
Tome-se o país afora. Os candidatos a prefeito da base governista lideram em 20 das 26 capitais. A se confirmar a tendência nas urnas, muito do êxito terá de ser creditado às faíscas reluzentes do lulismo.
Pipocam aos montes na TV candidatos de nome "Lula" que não nasceram Luiz; outros tantos imitam a voz do presidente no rádio, encenando o apoio que gostariam de receber. Mesmo a oposição entrou na onda: no Nordeste, postulantes do PSDB e do DEM proíbem que seus aliados critiquem Lula porque atrapalha; vários deles chegam a disputar sua proximidade.
A eleição ilumina um fenômeno que a ultrapassa. A vida de muita gente melhorou, é fato. A mitigação da miséria obtida com os programas de transferência de renda e a elevação do consumo na faixa social que a propaganda oficial se apressa em chamar de "nova classe média" são o pau que sustenta a lona do circo onde se anuncia o céu estrelado. Os ricos também nunca ganharam tanto. A fera barbada de 89 se transformou no domador do espetáculo.
Para além da economia, que explica muita coisa, Lula é hoje um fator de pacificação social. Alguém diria que é capaz de tirar as meias sem tirar os sapatos. Descomprimiu um imenso passivo de iniqüidades sem mexer com os poderosos. Pelo contrário, faz um governo concessivo, que se serve sem pudor das forças do atraso e conduz seu barco nas águas do conservadorismo.
Lula é nosso esperanto social, a encarnação do "&" que conecta e separa Casa Grande e Senzala. Ele é a expressão máxima da democracia brasileira. E talvez de seus limites.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0809200803.htm

quarta-feira, 3 de setembro de 2008

"Ô tranqueira do 'caráio'!"

Fiquei curioso para saber quanto tempo ele levou para fazer de bicicleta o mesmo trajeto que faço todos os dias de carro ou de metrô.

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São Paulo, quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Repórter-ciclista encara trânsito, buraco e palavrões

Às vésperas de início de projeto que oferece bicicletas, Folha percorre 15 km nas ruas de SP

Trajeto saiu da Praça da Árvore e foi até o Anhangabaú; passeio incluiu risco do tráfego intenso e hostilidade de motoboys nas ruas da cidade


Joel Silva/Folha Imagem

Ônibus ultrapassa bicicleta de repórter Paulo Sampaio, alugada na região de Moema (SP)


PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL

O motoboy enfurecido cola na bicicleta do repórter e grita: "Ô tranqueira do "caráio'!". Com a moto inclinada, ele se esgueira numa inacreditável manobra e ultrapassa a bicicleta para entrar em uma rua de mão dupla, próximo à avenida Jabaquara (zona sul de SP).
Isso foi logo nos primeiros 500 m do percurso de cerca de 15 km, pedalados ontem pela reportagem para testar a viabilidade de um projeto de empréstimo e aluguel de bicicletas em oito estações do Metrô paulista. O projeto é do Metrô, em parceria com a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente.
Para acompanhar o repórter no teste, convocou-se o experiente ciclista Otoni Gali Rosa, 69, que há seis anos pedala com grupos em percursos que chegam a 100 km.
Como o repórter alugou a bicicleta em Moema (zona oeste), precisa percorrer um bom trecho para chegar ao escritório de Gali, na Praça da Árvore, zona sul, local do encontro. De saída, tem de enfrentar avenidas como Indianópolis, Vergueiro e ruas largas como a Domingos de Morais.
Com a bicicleta embalada, em um momento de vento a favor, o ciclista vê seu caminho subitamente afunilado por um ônibus estilo centopéia que para no ponto.
Dele desce morosamente uma senhora de cabelos brancos, carregando duas sacolas cheias; ela pousa no asfalto ondulado o pé direito. A bicicleta quica na buraqueira.
Vindos do ponto de ônibus, o ciclista percebe olhares generalizados de desprezo. O capacete o faz se sentir meio ridículo, como se estivesse de peruca, prestes a atropelar uma velhinha.

Não dá pra repetir
A partir da Praça da Árvore, o risco aumenta até a estação Anhangabaú (centro). Quatro das oito estações desse percurso estão no projeto de aluguel de bicicletas: Vila Mariana, Paraíso, Sé, Anhangabaú. No trajeto, nenhum metro de ciclovia.
Pedalar sem a menor segurança entre ônibus, carros, carroças, carrinhos de supermercado, motos, pedestres, fumaça e buracos até pode, para quem gosta de esportes radicais, ser emocionante. Mas não dá pra repetir todos os dias.
"A CET não considera bicicleta como meio de transporte", admira-se o arquiteto Paulo de Tarso Martins, fundador de um grupo chamado Sampa Bikers, que tem 15 anos e reúne em seu cadastro 15 mil ciclistas. "Mas é sempre assim. Em véspera de eleição, o povo nos procura com projetos especiais para ciclistas. Não vou ajudar a eleger ninguém que vai nos esquecer depois."
Assessores informam que a CET não quer se manifestar sobre a declaração de Martins. Um deles diz que o Detran pode informar sobre a frota de bicicletas. No Detran, a assessora leva um susto. "Nós não temos nada a ver com isso".
Para Martins, Otoni e o presidente da Federação Paulista de Ciclismo, Fernando Mazzaron, não adianta começar um projeto sem infra-estrutura (ciclovias) e educação no trânsito.
A prefeitura promete inaugurar 12 km de ciclovia na Radial Leste, de um total de 25 km em construção.

Só de carro
Para quem se locomove apenas de carro há mais de 20 anos, e que portanto está acostumado ao ponto de vista do motorista, a atitude de Otoni no trânsito parece arrogante.
Ao atravessar as ruas que saem da avenida Vergueiro, por exemplo, e que podem ser acessadas por (muitos) automóveis, ele se limita a esticar o braço e a movimentar os dedos para que quem estiver vindo páre.
"Sabia que a distância mínima que os carros devem manter de uma bicicleta, segundo o Código Nacional de Trânsito, é de um metro e meio? E que um ciclista não deve pedalar a menos de um metro da calçada?", pergunta Otoni.
Mas ele mesmo reconhece que, com os exíguos 4,5 km de ciclovias, em relação aos 17 mil km de ruas e avenidas de São Paulo, nem mesmo os ciclistas estão preparados para viver uma experiência parisiense, como a que inspirou o projeto. Lá, desde 2007, alugam-se 10 mil bicicletas. Aqui, serão 80, 10 em cada estação, a R$ 2 a hora, R$ 50 a diária. Nos primeiros 30 min, o uso é gratuito.
"Poucos são os que andam de capacete, com lanterna e levam na mochila apetrechos para resolver qualquer problema que aconteça com a bicicleta. Na verdade, não dá pra chamar todo mundo que anda de bicicleta de ciclista", diz, apontando para um jovem que vem pela contramão, na calçada.
O repórter confessa que, já na metade do trajeto, mesmo como ciclista rechaçado pela massa motorizada, ainda tinha mais facilidade para entender a irritação dos motoristas.

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0309200810.htm

Crime e castigo

Comentários no final do artigo. Ainda que por vezes a vontade é dizer "sem comentários...".

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São Paulo, quarta-feira, 3 de setembro de 2008

Maníaco confessa crime pelo qual 3 estão presos há 2 anos

Jovens afirmam que à época só confessaram o assassinato de garota após terem sido torturados


ANDRÉ CARAMANTE
DA REPORTAGEM LOCAL

Renato Correia de Brito, 24, William César de Brito Silva, 28, e Wagner Conceição da Silva, 25, estão presos desde agosto de 2006 sob a acusação de terem violentado sexualmente e assassinado Vanessa Batista de Freitas, 22. Os três sempre disseram à Justiça que só confessaram o crime porque foram torturados por policiais.
Os três rapazes afirmam terem sido torturados com sacos plásticos, gás de pimenta, choques elétricos, socos, tapas e pontapés em uma região despovoada de Guarulhos e no 1º Distrito Policial da cidade.
Tanto que, na próxima semana, estava previsto que eles deveriam ir para o banco dos réus do Tribunal do Júri para serem julgados pela morte de Vanessa, ex-companheira de Renato.
A situação jurídica de Renato, William e Wagner começou a mudar na noite de sexta-feira passada, quando Leandro Basílio Rodrigues, 19, chamado pela polícia de "maníaco de Guarulhos", confessou com detalhes ao delegado Jackson Cesar Batista que havia matado Vanessa em um matagal do Jardim Alice, periferia de Guarulhos.
A partir da confissão de Rodrigues, o promotor Marcelo Alexandre de Oliveira, o mesmo que havia denunciado os três à Justiça pelo crime, pediu ao juiz Leandro Jorge Bittencourt Cano, do Tribunal do Júri de Guarulhos, para revogar a prisão preventiva dos três acusados. O juiz acolheu o pedido de Oliveira e os três deverão ser soltos ainda na manhã de hoje.
Com mais esse crime contra Vanessa, subiu para seis o número de mulheres que Rodrigues, preso desde 27 de agosto, confessa ter matado. As mortes de Vanessa Kimura e de uma grávida também são investigadas como tendo sido cometidas pelo "maníaco de Guarulhos".

URL: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/cotidian/ff0309200801.htm

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Dada minha minúscula tolerância à dor e à idéia de ser torturado, é possível que eu confessasse a autoria dos mesmos crimes por muito menos, talvez pela simples menção ou ameaça de tortura -- o que não deixaria em mim nenhuma marca para provar a alegação de confissão sob tortura.

O problema não é apenas o da violência policial (aliás, quem torturou não merece receber o honroso título de policial, visto que são criminosos). Isso é sintoma. É sintoma de uma polícia não-preparada para o papel investigativo. Não estou generalizando isso para todos os policiais. Temos focos de excelência na Polícia Civil de São Paulo, e avançamos muito com relação a duas décadas atrás -- período habilidosamente retratado por Tiras, gansos e trutas: cotidiano e reforma na polícia civil, de Guaracy Mingardi (não à toa, mereceu um capítulo inteiro da minha tese de doutorado para analisar todos os elementos que ele trouxe para o debate sobre segurança pública no Brasil).

Mingardi mostrou os mecanismos e a estrutura perversa de incentivos que fazem com que a corrupção policial não apenas coloque inocentes atrás das grades e deixe perigosos criminosos fora dela, mas que realimentam o problema, gerando mais, e não menos, criminalidade. É difícil mostrar toda a cadeia (sem trocadilhos) do raciocínio sem tornar esse post imenso e pesado de ler (aliás, já está). Para quem tem dúvidas, indico o livro acima, ou ofereço minha tese, para quem quiser se informar mais (e, acredito, melhor) sobre o assunto.

Isso sem falar que os três rapazes que foram presos injustamente não sentirão apenas alívio. Depois do alívio, vem a indignação e o ódio. E são vítimas perfeitas para serem capturadas pelo crime organizado, que lhes oferecerá a chance de se "vingar contra o sistema". Os policiais que deixaram de fazer seu trabalho investigativo em troca do aparentemente menos trabalhoso trabalho de tortura podem ter, inadvertidamente ou não, criado mais três criminosos...

terça-feira, 2 de setembro de 2008

Nos bastidores do impeachment evitado

Linha direta entre Lula e FHC evitou pedido de impeachment
Conversas secretas, intermediadas por Palocci e Bastos, ajudaram a esfriar caso do mensalão

Carlos Marchi  |  O Estado de S. Paulo, 31/8/2008

Durante todo o primeiro mandato e parte do segundo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve uma linha direta de consultas com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, mantida por meio de conversas secretas dos então ministros Antonio Palocci, da Fazenda, e Márcio Thomaz Bastos, da Justiça. A linha direta funcionou com mais vigor no auge do escândalo do mensalão, quando os ministros pediram a Fernando Henrique para agir e evitar que a oposição descambasse para pedir o impeachment de Lula. Ele atendeu e se posicionou publicamente contra o impeachment.

Os encontros foram confirmados ao Estado pelo ex-presidente, Palocci e Bastos. Palocci confirmou que esteve pessoalmente com Fernando Henrique "pelo menos cinco vezes"; Bastos disse ter conversado com ele pessoalmente apenas uma vez, em junho de 2005, momento em que crescia a onda do impeachment. Mas os contatos por telefone foram bem mais freqüentes, confirmam os três. Palocci e Bastos asseguram que Lula sempre soube das conversas antes de elas ocorrerem e foi informado do seu resultado depois.

Mais de uma vez, no entanto, em momentos de difícil enfrentamento com a oposição, Lula sugeriu a Palocci: "Vai conversar com Fernando Henrique." E pelo menos uma vez, em dezembro de 2007, o presidente determinou expressamente que Palocci - então já fora do governo - procurasse o tucano para negociar o projeto de reforma política que pretendia enviar ao Congresso no começo de 2008. Palocci marcou a conversa, mas antes que ela acontecesse Lula desistiu de promover a reforma política.

Ao Estado, Fernando Henrique elogiou Palocci e Bastos, confirmou as conversas e disse que elas foram possíveis porque os dois ex-ministros de Lula têm "noção institucional". Estendeu o elogio ao chefe de gabinete Gilberto Carvalho: "Esse também tem noção institucional." Lamentou que a linha de consulta tenha sido interrompida em 2008. No começo, não foi difícil a Palocci procurar o ex-presidente: além de manter excelentes relações com a oposição desde quando era ministro, ele tem a simpatia de Fernando Henrique desde que, prefeito de Ribeirão Preto, inaugurou uma estátua dele na cidade. "Não foi fácil para ele", reconhece o ex-presidente. Do gesto, brotou afeto.

A conversa com Bastos ocorreu no dia 26 de junho de 2005, no apartamento do ex-presidente, em Higienópolis, e durou das 21 horas à 1 hora da madrugada. Não faltava intimidade pregressa aos dois: antes de serem amigos, eles conviveram em função da amizade dos seus pais. Bastos contou a Fernando Henrique os receios que Lula alimentava e perguntou sobre o espírito então reinante na oposição. A expressão exata que usou foi: "Precisamos baixar essa bola."

Argumentou que ninguém podia apostar no pior, porque o País ficaria ingovernável. O ex-presidente concordou, deu um conselho e fez uma promessa. O conselho foi que Lula cuidasse de segurar os números da economia e impedisse que se evidenciassem sinais externos de desgoverno; a promessa foi que não jogaria lenha na fogueira e tentaria acalmar seus pares. Nas semanas seguintes, a sua influência foi sentida e acabou sendo vital para que a oposição refreasse o ímpeto e não chegasse ao limite do pedido de impeachment.

Três anos depois, olhando para trás e avaliando a situação, o ex-presidente minimizou o fato de ter atendido aos apelos. "Eu não fiquei contra o impeachment porque eles me pediram, mas porque sou muito cauteloso nessas questões. Na época, não havia condições políticas para sustentar um pedido de impeachment de Lula. Criaria uma cisão no Brasil", alinhou. Explicou por que aceitou as conversas secretas: "Adversários políticos não devem ser tratados como inimigos."

MERGULHO NO ESCURO

Tudo azedou repentinamente quando, em 8 de julho de 2005, em meio a um evento no Palácio do Planalto, Bastos foi informado de que um assessor do deputado José Nobre Guimarães (irmão do então presidente do PT, José Genoino) fora preso em São Paulo com dólares na cueca. Transmitiu o informe a Lula na mesma hora. Depois, relataria a um amigo que, em quatro anos de convivência, nunca vira Lula tão desolado. "Meu Deus, onde é que isso vai parar?", balbuciou o presidente, como se tivesse perdido o rumo.

Mas o pior ainda estava por vir. Em 11 de agosto, o publicitário Duda Mendonça confessou, na CPI dos Correios, que recebera no exterior parte do pagamento pela campanha de Lula. Naquela noite, Bastos e Palocci foram conversar com o presidente na Granja do Torto. Sem rodeios, opinaram que a confissão de Duda o atingia pessoalmente e que a situação, a partir disso, fugia ao controle do governo. As análises impactaram Lula, que aceitou a sugestão de procurar Fernando Henrique mais uma vez para negociar.

O enviado desta vez foi Palocci, que fez ao ex-presidente um relato assustador. Contou que o governo se sentia desorientado e que os conselheiros próximos a Lula temiam por ele após as últimas revelações, que iam do grotesco (os dólares na cueca de um assessor petista) ao dramático (a comprovação de que Duda recebera dinheiro ilegal pela campanha, o que jogava o escândalo no colo de Lula). Disse que havia novos escândalos não revelados, como um rombo que passaria dos R$ 500 milhões no Banco do Brasil.

Palocci chegou a admitir que tudo aquilo era "um desastre, um desastre". Noutro momento, teria dito: "Está tudo perdido." Ao final, fez um apelo "em nome da democracia e do futuro do País" - que a oposição desse uma trégua para dar tempo ao governo de "consertar tudo", exorcizando o seu visível lado podre. Ao final, indagou se Fernando Henrique aceitaria um encontro com Lula. O ex-presidente topou; exigiu apenas que houvesse um convite e um encontro públicos.

URL: http://www.estado.com.br/editorias/2008/08/31/pol-1.93.11.20080831.18.1.xml

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

São Paulo por um plano melhor

Não falta trabalho para as empresas de construção civil em São Paulo. Temos um déficit habitacional imenso, uma malha viária em péssimas condições etc.

Mas em vez de lançarem um plano voltado às reais necessidades da cidade, as construtoras resolvem elaborar e disponibilizar um plano voltado ao próprio umbigo. É triste...

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São Paulo, segunda-feira, 1º de setembro de 2008

Construtoras criam obras de R$ 15,6 bi para vender a SP

ALENCAR IZIDORO
RICARDO SANGIOVANNI
DA REPORTAGEM LOCAL

Algumas das principais construtoras do país criaram um plano de 200 obras viárias na cidade de São Paulo, ao custo estimado de R$ 15,6 bilhões, com a ambição de "servir de orientação às equipes dos candidatos" à prefeitura e de influenciar as decisões do poder público nos próximos anos.

[...]

O plano das construtoras é intitulado "São Paulo por um trânsito melhor". Na avaliação de cinco especialistas ouvidos pela Folha, a proposta de expansão da malha viária principalmente voltada para os carros vai na contramão da necessidade de restrição ao transporte individual e de prioridade ao coletivo.

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